QUINTA-FEIRA, AGOSTO 20
Hospital "mercado"
«A ideia de que se deve olhar para os hospitais como empresas da maior complexidade surge então naturalmente. Poucas empresas em Portugal lidam com centenas de milhões de euros por anos, milhares de pessoas como recursos humanos e como utilizadores nas suas instalações. Apesar da naturalidade dessa comparação, na verdade, gosto de propor uma outra forma de pensar, outra analogia – o hospital como “mercado” onde um conjunto de agentes procura recursos (os médicos) e outro conjunto oferece recursos (a administração), não havendo preço mas negociação nessa relação. A analogia com um “mercado”, e não com uma empresa, resulta de haver duas cadeias de autoridade dentro do hospital, e não apenas uma como nas empresas. Por um lado, a hierarquia médica, que define os tratamentos e solicita recursos para cumprir os objectivos assistenciais. Por outro lado, a administração, hierarquia administrativa, responsável por um orçamento global, e que disponibiliza os recursos necessários para os tratamentos. Uma consequência desta analogia é que para perceber em que medida as instituições de saúde cumprem, de forma eficiente ou não, o seu papel é necessário que estas duas partes se relacionem da melhor forma possível. Não é só necessário que a decisão de cada profissional de saúde seja a melhor possível. É também necessário que a gestão das instituições consiga garantir os recursos necessários no momento adequado, e de uma forma que faça um balanço entre as diferentes solicitações que recebe. A atenção à qualidade da gestão intermédia nas unidades prestadoras de cuidados de saúde é um fator que pode contribuir para um melhor desempenho assistencial do Serviço Nacional de Saúde. Compreender melhor o contexto dessa gestão é, por isso, essencial. Curiosamente, na discussão pública sobre recursos humanos na saúde, a qualidade da gestão e a avaliação dessa qualidade de gestão é normalmente ignorada. Provavelmente, faz mais diferença do que se pensa, pois os ganhos de eficiência que todos dizem querer ter no Serviço Nacional de Saúde para ajudar à sua sustentabilidade dependem de muitos pequenos passos que têm de ser definidos e aplicados pela gestão intermédia das instituições. Se os conselhos consultivos criados ajudarem as organizações (os hospitais, desde logo) a olharem para a qualidade da sua gestão, então darão um importante contributo para uma maior eficiência do Serviço Nacional de Saúde.»
Pedro Pita Barros link
É corrente a constatação de duas cadeias de autoridade nos hospitais: a hierarquia médica, que define os tratamentos e a hierarquia administrativa, que disponibiliza recursos necessários aos tratamentos.
É dificil de aceitar, no entanto, que a relação entre estas duas hierarquias sejam, essencialmente, relações de mercado ao ponto de caracterizar o hospital como “mercado” onde um conjunto de agentes procura recursos (os médicos) e outro conjunto oferece recursos (a administração), não havendo preço mas negociação nessa relação.
À medida que se foi desenvolvendo a organização dos hospitais com a inerente padronização de recursos adequados a cada situação clínica, estabelecimento de objectivos de eficiência/ qualidade e renovação do compromisso de autonomia médica, a hierarquia administrativa assumiu, progressivamente, maior controlo do poder de gestão das unidades hospitalares.
Hoje em dia, as relações de negociação quase permanentes entre as duas hierarquias foram sendo substituídas por relações empresariais traduzidas na obrigação de cumprimento de objectivos de produção/qualidade, constantes dum plano de actuação comum, elaborado por um grupo de gestores profissionais. Esta relação, cada vez mais empresarial, é tanto mais evidente nos hospitais PPP, onde o poder de contratação de profissionais médicos (e não só) é mais ampla.
Se cá nevasse fazia-se, cá, ski
NB: o autor é da escola onde não se sabe que a eficiência está do lado do plano e eficácia está do lado dos resultados, porque usa sempre a palavra eficiência onde devia usar a eficácia.
Quanto ao mais sofre da mesma anfibologia. São os teóricos que temos no mercado dos hospitais. (José Azevedo)
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