quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

GANHÁMOS MAIS UM AO CHSJ (ler o texto do mais um)

O processo que o presidente do conselho de administração do CHSJ intentou contra a Direcção do Sindicato dos Enfermeiros foi arquivado.
ACTUALIZAÇÃO

 
Não se trata da atual Direção, mas da do mandato anterior, como os nomes indicam.
Aqueles que já andavam a ser instrumentalizados para dizerem que não tinham nada a ver com o que os comunicados diziam; que isso foi obra do presidente, podem finalmente respirar de alívio, pois já não têm de se expor ao paradoxo de estarem entre dois limites: o da heroicidade e do dever e o da covardia e pusilanimidade.
É que, no fundo, bem lá no fundo, pois estamos a atuar nos limites de muita coisa, acabam por ter razão: eles não teriam o atrevimento de dizer o que o presidente da Direção disse, justamente por causa do paradoxo acima citado.
E se não iam dizer isso, muito menos o iam escrever, pois não tiveram culpa que ele os escolhesse para defenderem uma Classe, cada vez mais amordaçada e mal paga e muito mais mal compensada pelo seu mérito, justamente devido à covardia ou pusilanimidade de muitos  dos seus "defensores" inertes, que se instalaram no seu comodismo e não querem ser incomodados.
Se estivessem para se incomodar não teriam vendido a alma ao diabo, que lhes garante paz podre e sossego destruidor.
Quem não se lembra do triste espetáculo que foi o julgamento do Presidente/Sindicato pela queixa de Conceição da Rocha, lá atrás, na sala de audiências, sentado, a marcá-los?
Está-se perante um erro grave da assistência aos julgamentos. Distração dos juízes que não deixam entrar na sala as testemunhas, mas deixam entrar os patrões ou equivalentes, para intimidarem, com a sua presença, as testemunhas frágeis covardes, pusilânimes. Neste caso, era um diretor que foi expulso por Correia de Campos por não ser militante do PS e de um Supervisor, que ficava, por ser do Partido, vindo de Matosinhos, onde se identificava com a UDP e não só, até foi ocupar a vaga no Alcoitão, na frequência da especialização de reabilitação, destinada e merecida por Sousa da Silva, cujo marido, na altura da inscrição, se pôs a mostrar, distraidamente, o porta-chaves do CDS.
Apesar de ser interino, no HSJ, pois acumulava com Matosinhos, Costa Leite concedeu-lhe bolsa de estudo, dado o perfil do candidato, ao que tudo indica. Com a visão política e partidária que esta tinha, em produzir fenómenos, como o da mulher de branco, Voluntária que rejeita a farda amarela, para não parecer o fantasma do -02, onde tem a toca, de parceria com os ratos, que por lá se passeiam, lá conseguiu mais um.
E o presidente, diretor deposto, até parece que defendia a sua pessoa e não a das testemunhas que o traíram, traindo-se a si próprias, pois foi para as defender, que o presidente se expôs e o bando dos inimigos da Enfermagem, onde estão os covardes, montou o esquema da vingança.
Todos eles se esqueceram que a justiça tarda mas não falha!
Quando os governantes quiserem e ou puderem olhar, a sério, para o que mostra e esconde a administração "suchista" do CHSJ, comecem pelo aluguer dos guindastes, ao alto, olhando o céu, passem ao aluguer dos contentores, perfeitamente inúteis num mar de espaços vazios ou mal utilizados, revistem os carimbos que marcam as datas dos concursos e se mudam manualmente, para marcarem, segundo as conveniências,  as datas de entrada dos documentos, facto que nem os concorrentes lesados notam.
Que vejam o dinheiro que o CHSJ gasta em advogados de causas perdidas e quantas as custas de processos, que subtrai, ao erário público.
Jacinto, o homem que transformou um campo de ratos, num refeitório de utilidade pública digno de louvor, foi expulso dessa obra como um cão vadio, pela administração que Correia de Campos (que coisa; é sempre ele) nomeou e ainda se mantém perante a estupidez do actual governante.
É que o negócio das cozinhas é lucrativo e o exemplo do Jacinto, que ganhava honestamente a vida num serviço de utilidade e conforto de que o usava, fazia concorrência. A quem?
Descubram, pois não tenho de dizer tudo.
Às vezes, até compram espaço de publicidade daquela da post-modernidade, para dizerem mal deles próprios.
Pois é; Jacinto ganhou, ao HSJ, o processo, pela 2ª vez, que exige, por perdas e danos mais de meia dúzia de milhões de euros, na primeira instância e na Relação, ou 2ª instância, o que impede recurso para Supremos.
Quem vai pagar os 6 a 8 milhões de euros e a reposição do que destruíram, no BAR do Jacinto?
Que dirá a isto a troika e os troikanos, que cobrem com ela, as suas patifarias?
E o Sr. Ministro da Saúde, com o seu reconhecido mérito de rigor, nas contas, até nas que sonegam os vencimentos dos Enfermeiros, que diz a tamanha delapidação do erário público e das poupanças resultantes de cortes, no essencial do esqueleto, pois as gorduras, já se foram, há muito?
Quando é que os autores de gestões danosas começam a pagar os erros, que nos saem caros?
Parabéns, Jacinto pela tua vitória, contra um dos "lobis" mais poderosos, na Saúde, que não é, obviamente, o Conselho de Administração do CHSJ. Esse, apenas paga as contas com o nosso dinheiro, ou dos nossos impostos, se preferirem.
Também com este homem bom e prestimoso ao bem comum, a justiça tardou, mas não lhe faltou.
Como se vê, não é para me defender de coisas, que não são pessoais, mas do interesse comum, que me levam a tribunal e ameaçam, ASSEDIANDO-AS MORAL E PROFISSIONALMENTE as minhas testemunhas, estranha forma de as manipularem, com uma invenção da modernidade - o medo - e a quem o não tem, põe-se-lhe.
Estes monstros, cada um a seu jeito e estilo, até conseguem transformar a ação sindical, mui nobre e digna, toda ela altruísta, defensora dos legítimos interesses  e direitos dos trabalhadores, que constroem a obra, onde eles se sentam, numa ação criminosa de interesse pessoal. Monstros!
Sosseguem todos, porque a Justiça nunca falha, mesmo que tarde: por isso é que a lagoa vai secar.

Com amizade ética e Sindical
José Azevedo


Mas  já tinha ganho outro processo, como se pode ver no Acórdão, que se segue:








ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 4213/12.TDPRT.P1

4213/12.4TDPRT.P1

Nº Convencional: JTRP000 
Relator: NETO DE MOURA 
Descritores: OFENSA A ORGANISMO
SERVIÇO OU PESSOA COLETIVA
PROPALAÇÃO DE FACTOS
ELEMENTOS DO TIPO

Nº do Documento: RP201310024213/12.4TDPRT.P1 
Data do Acordão: 02-10-2013 
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S 
Privacidade: 1

Meio Processual: REC PENAL 
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO 
Temática: .

Sumário:

I – A jurisprudência aceita pacificamente que a tutela dos bens da personalidade de estenda às pessoas colectivas, afirmando-se a protecção do bom nome e da reputação, quer através da tutela geral da personalidade, quer através da estatuição de reacções penais como as do artigo 187.º do Código Penal, que tipifica como crime a ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva.

II - Porque a norma remissiva do n.º 2 do artigo 187.º não inclui o artigo 182.º do Código Penal (que equipara à difamação e à injúria verbais as feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão), tem-se firmado jurisprudência, com arrimo em alguma doutrina, no sentido de que estará excluída da tutela penal conferida pelo primeiro daqueles preceitos a ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço público cometida por uma forma de expressão que não seja a verbal.

III – No entanto, no seu sentido corrente, a expressão “propalar factos”, usada na descrição típica do artigo 187.º do Código Penal, tem um âmbito bem mais amplo do que a mera expressão verbal, significando divulgar, espalhar, difundir e, por conseguinte, comporta necessariamente outras formas de comunicação, diferentes da «palavra dita», como seja, desde logo, a «palavra escrita», pelo que não havia necessidade de qualquer remissão a alargar as margens de punibilidade do tipo a comportamentos exteriorizados de modo diverso da expressão verbal.

IV - Os factos inverídicos afirmados ou propalados pelo agente hão-de ser capazes, hão-de ter aptidão para ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos ao sujeito passivo (organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação).

V - Fica, pois, claro que, para a tipicidade, não basta que os factos sejam falsos (inverídicos), exigindo-se que sejam aptos a ofenderem aquele bem jurídico heterogéneo “normativamente cristalizado no bom nome”, avaliação que, nas palavras do Professor Faria Costa, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, I, 680, impõe um juízo de idoneidade que “deve operar de um modo absolutamente objectivo, o que é dizer que “a valoração do agente não tem aqui qualquer relevância”.

VI – As afirmações do arguido, presidente de uma associação sindical, consubstanciando um ataque pessoalizado, em que a visada é a enfermeira directora de uma instituição hospitalar, podendo, eventualmente, configurar um crime de difamação agravada, aqui não podem ser penalmente valoradas porque não houve queixa da eventual ofendida, pelo que o Ministério Público carecia de legitimidade para exercer a acção penal.

VII - As ofensas dirigidas pelo arguido a um elemento do Conselho de Administração da instituição hospitalar — a Enfermeira Directora — não são susceptíveis de serem entendidas como dirigidas ao próprio Hospital e assim de porem em causa o bom nome (prestígio, credibilidade e confiança) da instituição.

VIII – Entendimento contrário levaria a considerar que uma ofensa à honra – bem jurídico pessoalíssimo, atributo exclusivo da pessoa individual – é susceptível de preencher um tipo legal que tutela um bem jurídico (o bom nome, que agrega a credibilidade, prestígio e confiança) de que só podem ser titulares pessoas colectivas ou entidades equiparadas.

IX – Algumas afirmações (como “Essa gentinha que urdiu esta tramoia dos concursos de chefes…”) da autoria do arguido, podendo ser consideradas censuráveis pelo seu carácter excessivo e contundente, ainda assim não extravasam os limites do direito de crítica e da liberdade de expressão e por isso não têm idoneidade para atingir o núcleo essencial do direito ao bom nome de uma instituição hospitalar prestigiada como é o Centro Hospitalar de São João, estando, pois, excluída a tipicidade do seu comportamento.

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 4213/12.4 TDPRT.P1
Recurso penal
Relator: Neto de Moura

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto 

I – Relatório

No âmbito do processo comum que, sob o n.º 4213/12.4 TDPRT, correu termos pelo 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, “Centro Hospitalar de S. João, E.P.E.”, pessoa colectiva n.º ………, que requereu e foi admitida a intervir como assistente, não se conformando com o despacho de arquivamento que, no termo do inquérito iniciado com uma sua denúncia contra B…, requereu a abertura de instrução, no termo da qual, em consonância com o Ministério Público, mas contrariamente à posição da assistente, foi proferida decisão instrutória de não pronúncia (fls. 183 e segs.).
Ainda irresignada, a assistente veio recorrer dessa decisão para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral):

I. “O bem jurídico protegido pelo tipo legal de crime de ofensa a pessoa colectiva, pp. pelo artigo 187° do Código Penal, é o bom-nome da instituição, enquanto elemento agregador de outros bens jurídicos visados, como a credibilidade, o prestígio e a confiança. 

II. O tipo legal de crime comporta, assim, a afirmação ou propalação de factos inverídicos e que tais factos se mostrem capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança da pessoa colectiva 

III. As diversas afirmações escritas e propaladas pelo Arguido nos comunicados juntos aos autos, e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, contém factos inverídicos que ofendem a credibilidade, o prestígio e a confiança do Centro Hospitalar de S. João, EPE. 

IV. Da análise dos factos difundidos pelo Arguido através dos comunicados juntos aos autos resulta a sua tipicidade, bem como o carácter ofensivo da credibilidade, prestígio, e mesmo da confiança que é depositada ao Assistente. 

V. O Arguido atribui ao Centro Hospitalar de S. João, EPE, a prática de ilegalidades, o incumprimento de leis, imputa ao Conselho de Administração uma actuação ilegal, concretiza a prática de ilegalidades em concursos de selecção de enfermeiros, bem como imputa diversos factos ofensivos da credibilidade e confiança do Hospital a um dos elementos do Conselho de Administração - a Enfermeira Directora.
ACRESCE QUE, 

VI. As ofensas dirigidas pelo Arguido a um elemento do Conselho de Administração — a Enfermeira Directora — constantes dos documentos juntos com a participação, são susceptíveis de, aos olhos de um terceiro, ser dirigidas ao próprio Hospital, de forma que o bom nome (prestígio, credibilidade e confiança) do Hospital é posto em causa.

VII. O Conselho de Administração é o órgão executivo do Centro Hospitalar de S. João, EPE, representando-a perante o exterior, pelo que as ofensas dirigidas aos membros do Conselho de Administração, in casu, a Enfermeira Directora, repercutem-se na imagem real que os outros têm da pessoa colectiva que é 0 Centro Hospitalar de S. João, EPE (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 07-03-2007 (processo n.º 0610676) 
VIII. Pelo que, o Arguido faz também imputações de factos ofensivos do Centro Hospitalar de S. João, EPE, ao referir-se a um elemento que integra o Conselho de Administração — a Enfermeira Directora - nos termos dos comunicados em causa. 

IX. Com a sua conduta, o Arguido ofendeu o bom-nome e a consideração que o Centro Hospitalar de S. João, EPE, goza no contexto em que está inserido — comunidade médica, de enfermagem, de ensino e de investigação científica, por um lado, e comunidade de doentes e utentes, por outro. 

X. Em face do exposto, não assiste razão à decisão recorrida quando refere que expressões utilizadas pelo Arguido se apresentam com carácter generalizado, descarregadas de qualquer tipicidade, sendo certo que estamos perante afirmações que preenchem os elementos do tipo legal de crime em causa. 

XI. Nem tão pouco quando defende que as expressões utilizadas pelo Arguido não têm força bastante para ofenderem a credibilidade ou prestígio, ou mesmo a confiança que é depositada ao Assistente, enquanto Entidade Hospitalar de Serviço Público. 

XII. Ao contrário da decisão recorrida, entendemos que o Arguido, ao imputar ao Centro Hospitalar de S. João, E.P.E. a prática de ilegalidades e atropelos à ética, bem como uma actuação desonesta, nos termos constantes dos comunicados juntos a fls., ofendeu gravemente a imagem, o crédito, a confiança e a reputação do Hospital. 

XIII. A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 187°, 183°, n.º 1 b) ex vi alínea a), n.º 2 do artigo 187° do Código Penal e o artigo 308° do Código de Processo Penal. 

Pede, por isso, que, no provimento do recurso, seja proferida decisão de pronúncia do arguido pelo crime de ofensa a pessoa colectiva agravada. 

*
Quer o arguido, quer o Ministério Público apresentaram resposta à motivação do recorrente, com posições coincidentes no sentido da improcedência do recurso.
O arguido alega que agiu como Presidente C… e que é por causa dessa qualidade que a assistente/recorrente “continua nesta senda persecutória contra ele”.
A verdade é que os actos praticados foram-no em defesa dos legítimos interesses dos associados do sindicato e do que aqui se trata é de “um combate legítimo contra aquilo que o C… entendeu ser um concurso viciado e uma atuação censurável para com o C… e para com os enfermeiros que o recorrente mantém ao seu serviço”. Visadas não foram “pessoas, nem Instituição, mas toda uma atuação procedimental e administrativa que se considerou incorreta e merecedora de sublinhado”. 
*
Por seu turno, o Ministério Público formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem na íntegra):

1. Este crime é de mera actividade não dependendo a sua verificação de um dano, daí que para que exista incriminação de uma conduta quando— sem qualquer fundamento, para em boa fé se reputarem verdadeiros - se afirmar ou propalar factos inverídicos que sejam aptos ou idóneos a criar perigo para o bem jurídico protegido; 

2. Ofensa essa que terá de assumir relevo bastante para se poder concluir que tem aptidão para afectar 0 bem jurídico protegido; 

3. A mensagem escrita propalada pelo arguido junto de determinadas pessoas - como foi o caso, junto de terceiros ligados à sua profissão, poderá ofender - como poderá ter acontecido -, a honra e consideração de pessoas singulares; 

4. A liberdade de expressão atribuída a todos os cidadãos, não pode ultrapassar determinados limites, não se devendo confundir a instituição com quem a representa ou nela exerce funções (como aconteceu no caso presente), o que distingue a situação de estarmos perante um crime de injúria ou difamação ou um crime desta outra natureza;

5. Dado não existir norma remissiva do n.º 2 do art.187º do C. Penal para o artigo 182° do mesmo diploma, esse tipo legal de crime apenas não pode ser cometido através de escrito, gesto ou imagem, que não está penalmente protegido, sob pena de se estar a violar o princípio da legalidade; 

6. Outro tanto se não dirá quanto às visadas pessoas no dito “escrito”, como sejam a pessoa singular, Sra. Diretora do Departamento de enfermagem desse centro hospitalar, ainda que quanto a ela o procedimento criminal jamais poderia prosseguir mesmo entendendo-se estar em causa um crime de natureza semi-pública por falta de queixa;

7. As ditas expressões utilizadas não poderão ser suficientemente fortes e expressivas para porem em causa o bom nome, reputação e credibilidade dessa grande instituição hospitalar pública, reconhecida a nível nacional, conforme se reconhece na douta decisão; 

8. Devendo, pois ser mantido o despacho de não pronúncia; 
*
Admitido o recurso, e já nesta instância, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto manifestou a sua concordância com a posição tomada pela Magistrada do Ministério Público na 1.ª instância, pronunciando-se pela manutenção do despacho recorrido. 
*
Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, sem resposta da recorrente. 
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo, pois, apreciar e decidir. 

II – Fundamentação
A assistente pretende que o arguido seja pronunciado para ser submetido a julgamento pelos factos que enuncia no requerimento de abertura de instrução e que, na sua perspectiva, preenchem a previsão da norma incriminadora dos artigos 187.º e 183.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, configurando-se, assim, o crime de ofensa a pessoa colectiva agravada.
É geralmente aceite que são as conclusões pelo recorrente extraídas da motivação do recurso que, sintetizando as razões do pedido, recortam o thema decidendum (cfr. artigo 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, disponível em www.dgsi.pt/jstj) e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso.
Tal como acontece com o encerramento do inquérito[1], normalmente, a questão central do despacho que encerra a fase de instrução é a de saber se foram recolhidos indícios suficientes (pressuposto fundamental, quer da dedução de acusação, quer da prolação de despacho de pronúncia, pois, de contrário, terá de ser arquivado o inquérito e proferido despacho de não pronúncia) da existência de crime e, na afirmativa, quem foi o seu agente e se este é punível.
Porém, neste caso, não se questionando que o arguido é o autor dos factos objectivos descritos no requerimento de abertura de instrução (que reproduzem parte do conteúdo de dois comunicados subscritos pelo arguido enquanto presidente da Direcção C…), a questão que importa apreciar e decidir é a de saber se esses factos consubstanciam a prática de algum crime, concretamente, do crime de ofensa a pessoa colectiva e, portanto, se se justifica a sua submissão a julgamento. 
*
Os autos fornecem os elementos necessários (reproduções dos comunicados em causa, depoimentos testemunhais e declarações do arguido) para se poder ter como seguramente indiciado que:
1. O arguido é enfermeiro e, entre 18.07.2000 e 31.05.2005, fez parte do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de S. João, E.P.E.

2. À data dos factos denunciados, o arguido era presidente da direcção C….

3. Nessa qualidade, o arguido elaborou e subscreveu dois comunicados, ambos dirigidos aos enfermeiros do Hospital de S. João, que colocou no sítio www.C....pt e que remeteu, via e-mail, para um número indeterminado de enfermeiros que ali trabalham.

4. Desse modo, muitos profissionais de saúde daquele hospital tiveram conhecimento do conteúdo desses comunicados.

5. No primeiro desses comunicados, datado de 22.12.2011, sob o título “D…”, o arguido faz, entre outras, as seguintes afirmações:
«A recondução inexplicável, porque ininteligível do CA do Hospital merece uma menção muito especial pelo mal que essa enfermeira directora e quem a mantém no cargo, tem feito à Enfermagem»

«Vou dirigir uma saudação muito especial a todos os que suportam esta gente, numa administração de coisa pública, que rege o mal como actividade soberana». 

«A propósito desta 2.ª sentença absurda, ilegal, a directora enfermeira, fazendo jus ao seu conceito de honra e dignidade pessoais, propôs para presidente do júri, depois de ter como principal fonte de suspeição e incompatibilidade para o cargo, as perseguições que tem exercido, sempre sobre os Enfermeiros (...)»

«Deste último concurso fazem parte as mais aberrantes irregularidades processuais, a começar pela alteração do que dizia a sentença, passando por vários avisos de abertura, todos eles incorrectos, até à inclusão dos amigos, que não podiam entrar nunca, neste concurso, (...)» 

«Penso que a sede de vingança, por não lhes reconhecer a capacidade suficiente, para os cargos, que ocupam, como se comprova com as asneiras que têm feito, só e em consonância, não vai passar além dos inconvenientes momentâneos, temporários, pois a confusão das sentenças revela causa de anulação de tudo o que a dita fez, para favorecer, mais uma enfermeira, com características especiais, quanto ao local de trabalho e quanto aos interesses; outra, para ferir mais de perto uma sua vítima». 

«Esperava que o bom senso dos governantes imperasse e não reconduzissem gente desta, em cargos de tamanha responsabilidade e sensibilidade, imprópria para broncos».

«Esses mentirosos ainda não encontraram meio nem dinheiro para pagarem 26 mil euros que nos devem, desde Janeiro de 2006». 

«É o país que temos, governado por gente desta, quando há pessoas tão capazes!»

«Os sinos também vão dobrar, no Natal, por todos os que têm sido vítimas desta directora enfermeira. Dentro e/ou fora do país, havemos de encontrar quem faça justiça a estas vítimas inocentes». 

6. No segundo comunicado, datado de 17.01.2012, com o título “E…”, o arguido faz, entre outras, as seguintes afirmações:
«Essa gentinha que urdiu esta tramóia dos concursos de chefes de (15 vagas) podia aproveitar a oportunidade para se libertar dos guarda-chuvas que as cobrem». 

«Pela 3.ª prova e respectiva lista vê-se o pólo de influência das classificações». 

«Na das 15 vagas, aconselho-vos a verem qual é o chuço ou guarda-chuva, que está na moda e ou, na mó das influências (mó de cima) para perceberem, se a vossa curiosidade for tanta, o significado do lugar na escala. É à luz destes jogos de interesses que tem de ser vista a escala».

«Olhem para o triste espectáculo e reflictam no pouco respeito que a Enfermagem desse Hospital merece a quem o controla».

«Eram 4 as encomendas, por isso era preciso arranjar lugares».

«Ou 0 CA -HSJ faz o que quer, no cumprimento/incumprimento das leis?».
«Será que só executara uma sentença para satisfazer as encomendas que tinham dos influentes?».
«Não se sentem enojados com estas evidências?» 

«Se não fosse para satisfazer encomendas e reajustar as chefias que destoam no coro, será que executariam algumas das sentenças se perguntarem, como devia, ao tribunal, se o interesse da Administração fosse fazer obra isenta; limpa de compromissos?» 

«Será que este CA está acima da lei; ou será que são tão distraídos que nem dão conta que há leis?»

«Isto cheira mesmo mal!»

«Não fui eu que pretendi fazer história e dar lições a gente tão reles». 

«A injustiça é tão aberrante e paradoxal, que tem de ser levada até às últimas consequências, para que sirva de exemplo, contra os abusos. Há-de haver quem leia correctamente os factos, sem pressupostos ou encomendas: a justiça é cega e a lei é dura»

«A enfermagem, profissão nobre e digna tem de saber expurgar-se dos maus exemplos que a emporcalham».

7. O Hospital de S. João é um hospital universitário, um dos maiores hospitais do país, constituindo uma referência nacional e internacional em várias áreas da medicina. 
*
A nossa Lei Fundamental consagra, no seu artigo 26.º, n.º 1, entre outros, a protecção do direito ao bom nome e a questão que se tem colocado e continua a ser objecto de discussão é a de saber se, entendendo-se – como, correntemente, se entende – que este direito é uma decorrência da ideia de dignidade da pessoa humana, as pessoas colectivas deverão ou não ser excluídas desta tutela. 
A questão é tanto mais pertinente quanto é certo que, como ensina o Professor Menezes Cordeiro (Tratado de Direito Civil Português, I Parte Geral, Tomo III, Almedina, 103) os direitos de personalidade “foram histórica e dogmaticamente pensados para servir o ser humano: a pessoa singular” e transpô-los para além desse campo pode prejudicá-los, “amputando-os da sua conexão humanística ontologicamente decisiva e banalizando os argumentos basilares em que assenta”.
Culminando uma evolução de décadas, podemos hoje dizer que a jurisprudência portuguesa aceita pacificamente que a tutela dos bens da personalidade se estenda às pessoas colectivas.
Voltando à citada obra do Professor Menezes Cordeiro (Tratado…”, 104), podemos ler:
“Na origem temos problemas práticos, a que os Tribunais não podiam deixar de dar resposta. O descrédito de uma sociedade, provocado por afirmações falsas, provoca danos a diversos níveis: a actuação que a tanto houvesse conduzido não poderia deixar de ser sancionada”.
O direito ao nome e o direito à honra seriam dois dos direitos particularmente aptos à defesa dos interesses das pessoas colectivas.
Assim se manifestou o Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 292/07, de 29.05.2008 (DR, II, n.º 141, de 23.07.2008):
“As pessoas colectivas, tal como as singulares, têm direito a um nome, e naturalmente que têm todo o interesse em que o seu nome não seja devassado, que a ele não sejam associados factos ilícitos, ilegais, injuriosos, difamatórios ou quaisquer outros que ponham de algum modo em causa a sua posição no seio da sociedade. Daqui decorre que o direito ao bom nome não é exclusivo das pessoas singulares, podendo também ser dele titulares as pessoas colectivas”.
A nível infra-constitucional, a protecção do bom nome e da reputação é realizada, quer no âmbito do Direito Civil (através da tutela geral da personalidade que protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade moral, concretizada na norma do artigo 484.º do Cód. Civil: “Quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados”), quer através de normas penais, nomeadamente, e para o que aqui nos interessa, estatuindo uma reacção penal (prisão ou multa) para “quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismos ou serviços que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação” (artigo 187.º, n.º 1, do Código Penal).
Não obstante a tipificação penal desta conduta (introduzida com a Reforma Penal de 1995), continua a não ser consensual a ideia de que ela tenha a necessária ressonância ético-social para ser objecto de criminalização.
Com efeito, não é pacífico que continue a justificar-se a tutela penal do direito à honra e reputação.
O Professor José de Faria Costa (“Comentário Conimbricense do Código Penal – Parte Especial”, Tomo I, 1999, p. 601), a este propósito, diz não ter dúvidas em reafirmar a dignidade penal do valor da honra e da consideração e fá-lo “talvez um pouco contra algumas das actuais percepções do sentido dos ventos da história sobre este preciso ponto”.
Há, efectivamente, uma corrente de opinião que advoga a abolição do crime de difamação e a sua substituição por adequadas leis civis, ou seja, deveria ser, exclusivamente, a lei civil a definir o âmbito de protecção daquele direito[2].
Posição que é justificada nos seguintes termos:
“A criminalização de uma conduta implica um claro interesse do Estado em controlar a actividade em questão e atribui-lhe um certo estigma social. Em reconhecimento deste facto, os Tribunais Internacionais têm sublinhado a necessidade de os governos darem provas de contenção quando recorrem à criminalização na restrição de liberdades fundamentais. Em muitos países, a protecção da reputação é tratada principal ou exclusivamente como um interesse privado, demonstrando a experiência que a criminalização de declarações difamatórias é desnecessária para proteger adequadamente a reputação de terceiros” (cfr. Boletim “Informação & Debate”, VI.ª Série, n.º 3, Março 2010, publicação da ASJP).
A Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa aprovou mesmo uma recomendação [Recomendação 1814 (2007)] intitulada “Para uma descriminalização da difamação” em que, além do mais, exorta os Estados Membros a abolirem, de imediato, a pena de prisão para os casos de difamação e “convida o Comité de Ministros a incitar todos os Estados membros a reverem as suas legislações relativas à difamação e, caso seja necessário, a fazer alterações no sentido de as harmonizar com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, com o objectivo de remover qualquer risco de acusações abusivas ou injustificadas”[3].
No conflito entre a liberdade de expressão e de opinião e o direito à honra e reputação, o TEDH tem dado, sistematicamente, prevalência àquela, frisando que a liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e “vale não somente para as “informações” ou “ideias” favoráveis, inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que ofendem, chocam ou inquietam”[4].
Apesar de se reconhecer uma evolução no sentido de uma aproximação das suas decisões às posições do TEDH, os tribunais portugueses têm sido severamente criticados porque vêm adoptando o entendimento de que a honra, o direito ao bom nome e reputação se sobrepõem ao direito de liberdade de expressão e/ou informação e por isso se reclama uma inflexão da jurisprudência nacional (neste sentido, cfr. o Ac. TRL, de 23.05.2013; disponível em www.dgsi.pt)[5]. 
Ao desencadear procedimento criminal e ao fazê-lo prosseguir, com o requerimento de abertura de instrução, depois que o Ministério Público se decidiu pelo arquivamento do inquérito, a assistente/recorrente não ponderou devidamente todos os factores e circunstâncias que intercedem no caso. 
*
Como valorar jurídico-penalmente as afirmações do arguido contidas nos comunicados que divulgou, aqui reproduzidas?
 A Sra. Juíza de instrução fundamentou assim a decisão de não pronúncia:
“Não está em causa a qualidade do Assistente enquanto pessoa Colectiva.
Daí que, cabe apenas apreciar se aquele conteúdo pode entender-se de capaz para atingir, a credibilidade e prestígio, como também a confiança, do Assistente, enquanto tal.
Conforme se extrai do douto despacho de arquivamento, o Ilustre Titular do inquérito entendeu que não, concretamente, que as “expressões” utilizadas apresentam-se com carácter generalizado, descarregadas de qualquer tipicidade”.
Corroboramos tal entendimento. De facto, e, para além de não ter apurada a não veracidade das informações contidas nos respectivos comunicados, não vislumbramos força bastante nas expressões utilizadas pelo arguido e que possam entender-se como visando o Assistente, capazes de ofenderem a sua credibilidade ou prestigio, ou mesmo a confiança que lhe é depositada, em geral, enquanto Entidade Hospitalar de Serviço Público, nos moldes em que o referido preceito legal, as contempla.
Nesta conformidade e, reiterando-se na íntegra, as doutas considerações e conclusões aduzidas e contidas no douto despacho de fls. 98 e ss., que aqui se dão por inteiramente reproduzidas, para todos os efeitos legais, o Tribunal está convicto de que, uma vez o arguido, submetido a julgamento, pelas razões expostas, lhe não seria aplicada qualquer pena ou medida de segurança, razão pela qual, ao abrigo do preceituado no art. 308º, do CPP, decido não pronunciar o arguido B…, devidamente identificado a fls. 71 e, por conseguinte, determinar o arquivamento dos autos”.
Na resposta que apresentou à motivação do recurso, o Ministério Público começa por referir que há um novo motivo que reforça a posição tomada em sede de debate instrutório e que tem a ver com o modo de execução da acção típica, que se concretiza na afirmação ou propalação de factos inverídicos.
Invocando o acórdão desta Relação de 03.04.2013, proferido em processo em que ela própria interpôs recurso, entende a digna magistrada do Ministério Público que, uma vez que a norma remissiva do n.º 2 do artigo 187.º não inclui o artigo 182.º do Código Penal (que equipara à difamação e à injúria verbais as feitas por escrito, gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão), estará excluída da tutela penal conferida pelo primeiro daqueles preceitos a ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço público cometida por uma forma de expressão que não seja a verbal.
Sendo imputada ao arguido a difusão de dois textos escritos que teria colocado no site www.C....pt e que remeteu, por e-mail, para vários enfermeiros associados do C…, estaria, à partida, comprometido o preenchimento do tipo objectivo deste ilícito típico.
No referido acórdão (disponível em www.dgsi.pt) entendeu-se que “«Afirmar ou propalar» factos inverídicos pressupõe que a ofensa seja feita verbalmente, tanto mais que, o nº 2 do art. 187º do CP não remete para o disposto no art. 182º do CP, o que significa que o legislador não quis que esta última referida norma fosse também correspondentemente aqui (art. 187º do CP) aplicável. Mesmo em relação aos crimes previstos nos arts. 180º e 181º do CP, caso não existisse a equiparação consagrada no art. 182º do CP, a difamação ou injúria feitas, por exemplo, por escrito também não eram punidas”.
Já no acórdão de 23.05.2012, também desta Relação (disponível no mesmo sítio), se havia entendido que “a ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva [187º CP] se cometida por escrito, gesto ou imagem ou por qualquer outro meio de expressão que não o verbal, não está penalmente protegida”.
No acórdão da Relação de Lisboa de 08.09.2010 (www.dgsi.pt) decidiu-se que que o crime previsto no artigo 187.º do Código Penal pode ser cometido por meio de palavras escritas num artigo jornalístico publicado num jornal impresso, mas porque a lei (artigo 30.º da Lei da Imprensa), expressamente, assim o diz.
Fora dos casos em que a lei expressamente preveja esse (ou outro) meio (que não o verbal), uma vez que a norma remissiva do artigo 187.º, n.º 2, do Código Penal não inclui o artigo 182.º do mesmo diploma, “esta ausência da remissão para o artigo 182.º implica que se considere em princípio não penalmente protegida a ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva cometida por escrito, gesto ou imagem”.
Esta jurisprudência (aparentemente uniforme) tem arrimo na doutrina, concretamente, tem o apoio de Paulo Pinto de Albuquerque (“Comentário do Código Penal”, 2.ª edição actualizada, UCE, p. 585), para quem “outra interpretação violaria o princípio da legalidade”.
Porém, à semelhança do entendimento manifestado pelo Ex.mo PGA no seu douto parecer, temos sérias dúvidas de que essa seja a mais lídima interpretação da norma-texto em causa.
Parafraseando o Professor Faria Costa (“Comentário Conimbricense do Código Penal”, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, p. 679), as palavras têm um valor de uso e a expressão “propalar factos”, no seu sentido corrente, tem um âmbito bem mais amplo do que a mera expressão verbal, significando divulgar, espalhar, difundir e, por conseguinte, «comporta(m) necessariamente outras formas de comunicação, diferentes da “palavra dita”, como seja, desde logo, a “palavra escrita”» (citado parecer), pelo que não havia necessidade de qualquer remissão a alargar as margens de punibilidade do tipo a comportamentos exteriorizados de modo diverso da expressão verbal.
O entendimento de que aqui dissentimos levaria a que fossem meramente residuais os comportamentos puníveis, já que a forma mais comum de ofender uma pessoa colectiva é, precisamente, a palavra escrita. 
Foquemo-nos agora no outro elemento do tipo objecto do crime em análise: os factos inverídicos afirmados ou propalados pelo agente hão-de ser capazes, hão-de ter aptidão para ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos ao sujeito passivo (organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação).
Fica, pois, claro que, para a tipicidade, não basta que os factos sejam falsos (inverídicos), exigindo-se que sejam aptos a ofenderem aquele bem jurídico heterogéneo “normativamente cristalizado no bom nome”, avaliação que, nas palavras do Professor Faria Costa, Loc. Cit., 680, impõe um juízo de idoneidade que “deve operar de um modo absolutamente objectivo, o que é dizer que “a valoração do agente não tem aqui qualquer relevância”.
Cabe aqui recordar que, como se observa no acórdão desta Relação de 14.11.2012 (www.dgsi.pt), de que foi relator o Sr. Desembargador Dr. Joaquim Gomes, “tem-se considerado como criminalmente atípicos todos aqueles casos situados naquela margem jurídico-penalmente aceitável do relacionamento social e descarregados de qualquer imputação objectivamente ofensiva da honra ou consideração de terceiros, que se limitam a expressar, ainda que em termos mais acutilantes, uma consideração crítica ou mesmo qualificativa da pessoa visada” e, acrescentamos nós, que é afirmação recorrente do TEDH que “o direito de crítica não conhece limites quanto ao teor, à carga depreciativa e mesmo à violência das expressões utilizadas”.
Por outro lado, há que ter bem presente a distinção, nem sempre fácil, entre factos e juízos valorativos, pois estes não preenchem o tipo legal.
Passando ao concreto, os comunicados em causa são textos de difícil inteligibilidade (têm várias afirmações que são mesmo ininteligíveis) em que o arguido “dispara” em várias direcções, sendo visados desde governantes (Secretário de Estado da Saúde) até colegas enfermeiras, especialmente a enfermeira directora, passando por advogados e juízes (estes qualificados como “julgadores iletrados”).
Uma boa parte das afirmações consubstancia um ataque pessoalizado, em que a visada é a enfermeira directora do Hospital de S. João, considerada pelo arguido incapaz para exercer o cargo e que só tem feito mal à enfermagem, podendo, eventualmente, configurar-se um crime de difamação agravada, afirmações que aqui não podem ser penalmente valoradas porque não houve queixa da eventual ofendida, pelo que o Ministério Público carecia de legitimidade para exercer a acção penal.
Não concordamos, pois, com a tese da recorrente que sustenta que “as ofensas dirigidas pelo Arguido a um elemento do Conselho de Administração — a Enfermeira Directora — constantes dos documentos juntos com a participação, são susceptíveis de, aos olhos de um terceiro, ser dirigidas ao próprio Hospital, de forma que o bom nome (prestígio, credibilidade e confiança) do Hospital é posto em causa” (conclusão VI).
Um tal entendimento levaria a considerar que uma ofensa à honra – bem jurídico pessoalíssimo, atributo exclusivo da pessoa individual – é susceptível de preencher um tipo legal que tutela um bem jurídico (o bom nome, que agrega a credibilidade, prestígio e confiança) de que só podem ser titulares pessoas colectivas ou entidades equiparadas.
As demais afirmações visam um concurso para o preenchimento de vagas de chefia para enfermeiros, em que o arguido considera que houve ilegalidades (“as mais aberrantes irregularidades processuais, a começar pela alteração do que dizia a sentença, passando por vários avisos de abertura, todos eles incorrectos”), favorecimentos (inclusão dos amigos, que não podiam entrar nunca, neste concurso” e «eram 4 as encomendas, por isso era preciso arranjar lugares») e influências («jogos de interesses», «pela 3.ª prova e respectiva lista vê-se o pólo de influência das classificações»).
Subscrevemos, sem reservas, a afirmação do Ex.mo PGA de que “o que sobressai do conteúdo dos “comunicados” em causa não é o ataque directo ou indirecto à credibilidade do Centro Hospitalar de São João, E.P.E., mas o debate das questões que aí se suscitam, relativas à recondução e actuação do CA do Hospital e da “enfermeira directora”, classificações e favorecimento no preenchimento de vagas, e ao olhar crítico que se lhes dirige”.
Tais afirmações (que, bem mais que afirmações de factos inverídicos, são, sobretudo, juízos valorativos sobre aquelas questões) não têm, de modo algum, aptidão para beliscar o prestígio e a confiança angariados pela assistente.
Socorrendo-nos, novamente, do comentário do Professor Faria Costa (loc. cit., 681), “uma instituição tem prestígio sempre que, pelos comportamentos dos seus órgãos ou membros, ela se impõe, no domínio específico da sua actuação, perante instituições congéneres e, por isso mesmo, perante a própria comunidade que serve e que a envolve”.
O Centro Hospitalar de São João, E.P.E. é uma instituição prestigiada (mesmo a nível internacional) pela qualidade dos seus profissionais e dos cuidados de saúde que, há décadas, presta à comunidade envolvente e não são umas “diatribes” do arguido (já que o segundo comunicado tem por título “E…”) que vão pôr, minimamente, em causa esse prestígio.
Apesar de algumas afirmações claramente excessivas (“Essa gentinha que urdiu esta tramóia dos concursos de chefes…”), nenhuma delas é objectivamente ofensiva, nenhuma tem idoneidade para atingir o núcleo essencial do direito ao bom nome do Centro Hospitalar de S. João.
É nesta linha (de não conferir relevância penal e, portanto de excluir a tipicidade, a comportamentos que, podendo ser considerados censuráveis pelos excessos cometidos, ainda assim não extravasam os limites do direito de crítica e da liberdade de expressão) que se situam os acórdãos desta Relação de 14.11.2012 (“No que concerne à prática bancária, os bancos não estão apenas sujeitos ao escrutínio das entidades reguladoras do setor mas também aos juízos críticos dos cidadãos em geral, pelo que se deve ter uma maior compreensão e considerar como atípicas as manifestações públicas dos cidadãos que, no exercício do seu direito de liberdade de expressão, divulgam situações que podem ser enquadradas num comportamento de “bullying banks”, ainda que, para o efeito, usem uma linguagem dura e abstratamente insultuosa, como seja “ENGANARAM O POVO C/ SUAS ACÇÕES P’RA LEVAR NO BOLSO MAIS UNS MILHÕES” ou então “FUI ENGANADO! NÃO POSSO FICAR CALADO!”), de 09.05.2007 (“Não comete o crime de ofensa a pessoa colectiva previsto no artº 187º do CP95 quem, no âmbito do seu direito de petição e acção, através dos meios processuais e procedimentais adequados, imputa a uma Câmara Municipal uma ou mais ilegalidades”) e de 18.05.2005 (“I - Não ofende a honra e a consideração dos dirigentes de uma Câmara Municipal dizer-se que entre eles e um determinado Clube de Futebol existe uma perigosa promiscuidade. II- Não ofende a credibilidade de uma Câmara Municipal, com vista ao preenchimento do crime do art. 187º do CP95, dizer-se dela que é "uma organização verdadeiramente tentacular que põe em causa a independência, a legalidade e a imparcialidade das decisões dos órgãos municipais").
III – Decisão
Em face do exposto, acordam os juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao presente recurso e confirmar a decisão instrutória de não pronúncia do arguido.
Por ter decaído, pagará o recorrente as custas do processo, fixando-se em quatro UC´s a taxa de justiça (artigos 515.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Cód. Proc. Penal, 1.º, n.º 2, e 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais).
(Processado e revisto pelo primeiro signatário, que rubrica as restantes folhas).

Porto, 02-10-2013
Joaquim Neto de Moura
Vítor Carlos Simões Morgado
[1] Nos termos do art.º 283.º do Cód. Proc. Penal, o Ministério Público deduz acusação quando tiverem sido recolhidos “indícios suficientes de se ter verificado crime e de quem foi o seu agente” e no art.º 308.º substituiu-se o termo “crime” por “pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança”, expressão que corresponde à definição de crime que, “para efeitos do disposto no presente Código”, se contém no art.º 1.º do Cód. Proc. Penal. 
[2] Aliás, reúne cada vez mais adeptos a ideia de que uma acção cível a exigir do agente uma indemnização pelos danos causados com a ofensa à honra e ao bom nome é bem mais eficaz que uma acção penal em que, quando há condenação, o agente acaba por sofrer uma pena de multa, as mais das vezes, pouco mais que simbólica. Ainda recentemente, alguém (uma figura pública bem conhecida) se queixava das acções cíveis que contra ele têm sido intentadas, designadamente por magistrados e por associações sindicais, que lhe exigem a reparação dos danos morais e patrimoniais causados pelas ofensas à honra e dignidade pessoal e profissional que ele, amiúde, comete.
[3] O documento, traduzido a partir da versão inglesa, está publicado na Revista do Ministério Público n.º 114, Ano 29, 215 e segs.).
[4] Assim se exprimiu o TEDH no acórdão Oberschlick vs. Áustria (de 01.07.1997). O caso reportava-se a uma afirmação contida num artigo jornalístico em que um político conhecido, que havia feito a exaltação dos soldados do exército do III Reich, era apelidado de “imbecil em vez de nazi”, pois “este último epíteto favorecê-lo-ia”, tendo o TEDH considerado que, “sendo verdade que o termo “imbecil”, dirigido publicamente a um político, pode ofendê-lo, no caso em apreço parece à medida da indignação conscientemente suscitada por esse político. Constitui um elemento do debate suscitado por esse político através do seu discurso e traduz-se numa opinião que, como tal, não é passível de comprovação”. 
[5] São bem conhecidos alguns dos acórdãos do TEDH em que Portugal foi já condenado, precisamente, por ter sido dada prevalência ao direito à honra e reputação em detrimento da liberdade de expressão e de informação, consagrada, quer na CRP (artigo 37.º, n.º 1) quer na CEDH (artigo 10.º), quer ainda na Carta dos Direitos Fundamentais da EU (artigo 11.º, n.º 1).
Um dos primeiros (e, porventura, o mais conhecido) é o acórdão Lopes Gomes da Silva vs. Portugal, que está na mesma linha do acórdão mencionado na nota anterior.
O jornalista, então director do jornal “Público”, escreveu, em editorial, referindo-se a um candidato à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, que “nem nas arcas mais arqueológicas e bafientas do salazarismo seria possível desencantar um candidato ideologicamente mais grotesco e boçal, uma mistura tão inacreditável de reaccionarismo alarve, sacristanismo fascista e anti-semitismo ordinário” e que a figura do candidato representava “o que há de mais beato, bolorento e ridículo na direita portuguesa”.
Absolvido em primeira instância, mas condenado na Relação de Lisboa por crime de difamação agravada, depois de ter visto negado provimento ao recurso interposto para o Tribunal Constitucional, aquele jornalista recorreu ao TEDH que, considerando que o referido editorial se enquadrava no debate político que antecedeu as eleições e que, nesse contexto (de debate político) as restrições à liberdade de imprensa devem ser interpretadas restritivamente, concluiu pela violação do direito à liberdade de expressão consagrado no artigo 10.º da CEDH.
Os Professores J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (“Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 466) comentam, a propósito do direito ao bom nome e reputação, que o âmbito deste direito “não é menos intenso na esfera política do que na esfera pessoal, devendo ser harmonizado e balanceado com a liberdade do debate político e com a liberdade de crítica política, que são inerentes à democracia”, mas observam que “neste aspecto, o TEDH tem adoptado um critério assaz liberal na protecção da liberdade de expressão e opinião e do direito de crítica política em desfavor do bom nome e da reputação política dos titulares de cargos políticos ou dos agentes políticos”.
Este critério (em que o direito ao bom nome é preterido em favor da liberdade de expressão e de informação e, portanto, os limites da crítica aceitável têm uma amplitude maior que em outros âmbitos) aplica-se à actividade judicial, à actividade administrativa e a todas as pessoas (singulares ou colectivas) que têm uma função social de relevo.
Sabendo-se que os sindicatos e a actividade sindical têm uma importante dimensão política, também nesse âmbito aquele critério é válido.


Foi feita justiça, não a mim, mas àqueles que tenho o dever de defender, quando em meu entender, devidamente fundamentado, como foi o caso, foram vítimas de injustiça, como ficou demonstrado em livro, onde se explanam todas as manobras e erros reprováveis.
A Enfermagem que defendo e em que continuo a acreditar merece este meu sacrifício de passar algum tempo pelos Tribunais, à procura de Justiça.
Venceu a Justiça.
Foram redimidas em parte, as vítimas.
Só espero que estas vençam os processos que movemos, em seu nome e legítimo interesse. E que correm seus trâmites.
Hão-de vencer, creio convictamente, tal a razão que lhes assiste.
Com amizade e solidariedade às vítimas,
José Azevedo

NOTA BREVE: Quem estiver interessado em conhecer todos os pormenores desta injustiça pode adquirir o livro [O CONCURSO], disponível no Sindicato dos Enfermeiros - SE.
No CHSJ será distribuído Serviço a Serviço, pelo autor, para que os Enfermeiros do Hospital avaliem, por si, perante os factos, o que foi uma prova besta de força, no assalto às chefias de Enfermagem, por aqueles que pretendem partidarizar a Enfermagem, pagando esta o preço que já se nota tanto, que a ninguém restam dúvidas. HD.

POST-SCRIPTUM -
Atribuição da Comenda da Ordem de Mérito ao Prof. Doutor António Ferreira | Aula Magna
Dia 16 de Dezembro de 2013
Horário 10h30
Local Aula Magna
Entidade FMUP
 
António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do Hospital de São João e professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), vai receber, numa cerimónia tutelada pelo diretor da FMUP, a Comenda da Ordem de Mérito atribuída pelo Presidente da República.

A insígnia será entregue pelo Ministro da Saúde, na próxima segunda-feira (16 de dezembro), às 10.30, na Aula Magna.
Convida-se a comunidade hospitalar a estar presente.


 

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