terça-feira, 3 de dezembro de 2019

O EMERGENCISTA



O EMERGENCISTA É UMA CRIAÇÃO DE CUNHA RIBEIRO, ENTÃO DIRETOR CLÍNICO DO HOSPITAL DE SÃO JOÃO.
Estávamos no ano 2002. Cunha Ribeiro, com o seu poder de iniciativa inovadora, pensou criar mais uma especialidade médica a que iria chamar "emergências" e os seus detentores chamar-se-iam "emergencistas".
Para fundamentar melhor a iniciativa, destinada a preencher uma lacuna deste tamanho, pôs o Conselho de Administração de que eu fazia parte como Diretor Enfermeiro, a pensar onde poderia encontrar experiências inovadoras de at6endimento de urgência.
Sugeri a Austrália, país onde os dissidentes do SNS inglês foram parar (não esquecer a ligação da Austrália à coroa inglesa), portanto, onde existe um SNS de elevadíssimo nível teórico e prático.
Procurámos um voluntário para estudar "in loco", o funcionamento das urgências em Sydney e Melbourne.
Costa Maia distinto cirurgião encarregado dos transplantes hepáticos, foi o eleito, para esta importante iniciativa.
Quinze dias eram passados e Costa Maia regressa ao HSJ com as suas descobertas.
Perante o seu silêncio e a demora na entrega do relatório das suas observações, resolvi perguntar: Dr. Costa Maia, diga-me o que viu, por lá.
Foi uma viagem, de todo inútil, porque nas duas cidades, de Sydney e Melbourne, não há médicos em presença física nas urgências.
Só há Enfermeiros que seguem protocolos de atuação e só chamam o Médico se e quando for necessário. Este, por seu turno, tem um determinado período de tempo para aparecer e atuar.
Dizem eles que a receção e as primeiras 2 horas são da responsabilidade dos Enfermeiros, nomeadamente na preparação do sinistrado, para a intervenção do Médico, seja qual for a especialidade e área.
Ora, quando o jovem tirocinante nas urgências de Londres, Dr. Vasco Almeida de 26 anos diz:«Na Urgência, só sou chamado quando os Enfermeiros estão aflitos (leia-se quando os doentes precisam de Médico, porque Enfermeiro-Enfermeiro não se aflige, trata-se aqui, de erro de paralaxe).
Chocou-me ao início, mas o papel dos Enfermeiros é muito interventivo: dão altas, fazem  os internamentos, orientam para as consultas, etc...»
Fez o mesmo papel que o pacóvio na cidade, ao ver passar um elétrico a andar sozinho sem cavalos a puxá-lo. E ia mal informado pela problemática que serviu de base à sua formação, que foi o caos das Urgências em Portugal, onde os Médicos Portugueses descarregam as suas responsabilidades ao fugirem através duma Medicina Defensiva.
Disse os nomes das pessoas,intervenientes nesta experiência, por duas razões:
1 - Pelo respeito que ambos me merecem;
2 - Para que possam aquilatar, com verdade, o que vai por esse mundo fora, sem terem de se deslocar. Basta perguntarem.
E o Dr. Costa Maia é um excelente comunicador, entre outras qualidades.
Ainda não passou muito tempo em que o Dr. Costa Maia e um Comandante da TAP expusessem as vantagens da "checklist", no vizinho Hospital do de Magalhães Lemos, nas intervenções cirúrgicas, prática que viu eu ter introduzido, no HSJ, quando Diretor Enfermeiro.

Por isso quando afirmo que os problemas das Urgências Hospitalares, são criados pelos Médicos, sei do que falo, não só porque fui Enfermeiro Chefe das Urgências do Hospital de São João (1965 -1976),
como tenho tentado, de forma isenta e equidistante analisar o que se passa noutros países, onde não há a sem-vergonha do que se passa em Portugal.
Claro que a culpa não é só dos Médicos; é também dos Enfermeiros mal apoiados e orientados pela sua Ordem, que não se impõem, deixando os Médicos invadir a sua área de atuação, sem crítica visível.
Querem um exemplo.
Paguei 150 contos de reis no restaurante do Chico Fininho na Ribeira- Porto para dar de comer aos detentores ingleses e americanos do método de triagem tipo Manchester na Urgência.
Pensava criar um grupo autónomo, para fazer escola.
Alguns Enfermeiros, nas minhas costas, enquanto não entregaram a coisa a um tal Dr. Marques do HGSA, não descansaram. O resultado? Está À VISTA.
Esperar que os Médicos façam coisas diferentes daquelas que os seus mestres lhes ensinaram, é um erro, uma utopia das maiores.
Esperem, um pouco, para ver, porque esta problemática não acaba, aqui, pelo contrário; está a começar, aqui.

José Azevedo

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