GRAVIDEZ MUDA CEREBRO DAS MULHERES <prima>
Confirma-se: a gravidez muda o cérebro das mulheres
A estrutura do cérebro das mulheres é
alterada com a gravidez, talvez de forma irreversível. Investigadores
registaram uma adaptação dos circuitos neuronais que parece servir para
optimizar funções necessárias à maternidade. Nos homens nada parece mudar.
20 de
Dezembro de 2016, 8:32 actualizado a 20 de Dezembro às 8:32
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Reduções, do laranja para amarelo, de volume de matéria cinzenta no cérebro
(em várias perspectivas) durante a gravidez OSCAR VILARROYA
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Qualquer mulher que tenha
estado grávida sabe que o seu organismo passou por uma revolução. As mudanças
hormonais, a transformação física e todas as adaptações biológicas no corpo que
gera um novo ser. E o cérebro? Também muda, assegura uma equipa de cientistas
que avaliou, pela primeira vez, a estrutura cerebral de um grupo de mulheres
antes e depois da primeira gravidez. Não se sabe ainda se as alterações são
irreversíveis, só se sabe que, passados dois anos, o cérebro de uma mãe não
voltou ao que era antes.
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Um grupo de investigadores,
liderado pela Unidade de Investigação de Neurociência Cognitiva da Universidade
Autónoma de Barcelona (Espanha), recolheu dados durante cinco anos e quatro
meses de um grupo de 25 mulheres que ficaram grávidas pela primeira vez e 20
mulheres sem filhos. Os investigadores, que publicaram um artigo na revista
científica Nature
Neuroscience, também analisaram os cérebros de 19
homens que foram pais pela primeira vez (companheiros das mulheres grávidas do
estudo) e de 17 sem filhos. Todos os participantes no estudo foram sujeitos a
várias ressonâncias magnéticas.
No cérebro dos homens, que
parece ser imune à paternidade, não foram registadas alterações. Porém, o
estudo revela que, numa primeira gravidez, as mulheres sofrem reduções
significativas de matéria cinzenta em regiões que estão associadas à cognição
social. O que – espere, antes de fazer conclusões precipitadas – não significa
qualquer tipo de declínio das funções mas antes uma “sintonização” e
reorganização dos circuitos neuronais que optimizam o cérebro para melhor
desempenhar a tarefa de ser mãe.
Nos exames, observou-se uma
“redução simétrica no volume da matéria cinzenta na zona medial frontal e
posterior do córtex e também em regiões específicas, sobretudo, do córtex
pré-frontal e temporal”, refere o comunicado de imprensa sobre o estudo. Os
investigadores sublinham que existe uma notável sobreposição das alterações da
gravidez com a rede que está associada à teoria da mente, que nos permite
perceber o que os outros pensam e sentem.
“Acreditamos que as mudanças
observadas concedem uma vantagem adaptativa na transição para a maternidade,
por exemplo, facilitando a capacidade da mãe para perceber as necessidades do
seu filho”, explica ao PÚBLICO Susanna Carmona, investigadora na Universidade
Autónoma de Barcelona e uma das autoras do artigo. Estas mudanças nas mulheres
fazem parte, defendem os cientistas, de um processo de adaptação e de
especialização funcional para o momento especial da maternidade.
“As mudanças neuroanatómicas
localizadas em algumas das regiões do cérebro destas mulheres mostraram, por
exemplo, uma resposta neuronal mais forte aos seus filhos no período
pós-parto”, refere a investigadora. E aí reside, talvez, uma das mais
importantes implicações deste estudo, que, segundo Susanna Carmona, poderá
ajudar a perceber melhor “a fisiologia patológica de distúrbios como a
depressão pós-parto, podendo ajudar a prevenir e tratar esta desordem no
momento certo”.
Adolescência, outra
vez
Esta capacidade de sintonizar
o cérebro para novos desafios, tornando-o mais apto, não é exclusiva do momento
da maternidade. Nos cérebros destas mulheres, “as sinapses fracas são
eliminadas abrindo caminho para redes neuronais mais especializadas e eficientes”,
refere a investigadora, adiantando que este “mecanismo de ‘poda sináptica’
também ocorre durante a adolescência”. Assim, a reorganização – visível nas
reduções de volume de algumas regiões do cérebro – acontece na fase de
adolescência quando o cérebro apura as suas funções cognitivas e também, como
se prova agora, com a maternidade.
“Sabe-se que as hormonas
sexuais (esteróides) regulam a morfologia neuronal e provocam, nomeadamente na
adolescência, alterações no cérebro. Por isso, não é surpreendente que os
níveis hormonais sem paralelo da gravidez também o façam”, nota Susanna
Carmona.
Foto
Da esquerda para a direita, as investigadoras Susanna Carmona, Erika
Barba-Müller e Elseline Hoekzema que engravidaram durante este estudo DR
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Mas a conclusão de que o
cérebro muda com a gravidez pode apenas significar a confirmação de uma
suspeita para muitas mães. Muitas mulheres, admite a investigadora ao PÚBLICO,
queixam-se de um aumento da distracção e défices de memória durante a gravidez.
E Susanna Carmona sabe bem do que estas mulheres falam. A cientista e outras
duas das principais autoras do artigo engravidaram durante esta investigação.
Porém, e apesar de partilhar este sentimento, sublinha que os estudos que
associam a gravidez a alterações na memória ou outras funções cognitivas são
inconsistentes.
“No nosso estudo, não
observámos qualquer impacto cognitivo nas medições que fizemos.” Aliás, sublinha
a cientista, nas investigações em modelos animais (ratinhos, por exemplo) o
impacto hormonal da gravidez no cérebro conduz a uma emergência dos
comportamentos maternais mas também a melhorias persistentes da memória
espacial, para encontrar comida e capturar as presas. Ainda assim, Susanna
Carmona considera que seria interessante estudar “até que ponto estes problemas
não são causados por reduções de memória, mas antes por uma mudança da atenção
da futura mãe para estímulos e pensamentos sobre o bebé em prejuízo de outras
coisas externas, que não têm a ver com a maternidade”.
Por fim e não menos
importante: as mudanças observadas no cérebro das mães são irreversíveis? Além
dos exames feitos antes e depois da gravidez, os investigadores fizeram mais
uma sessão de ressonâncias magnéticas dois anos depois do parto. “Vimos que,
nessa altura, as mudanças ainda continuavam lá”, diz a investigadora, que
conclui: “Neste momento, não sabemos se os cérebros destas mães vão algum dia
regressar ao seu estado original, o que é altamente improvável, mas para saber
isso será necessário vigiar os seus cérebros nos próximos anos.”
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