sexta-feira, 17 de abril de 2015

DIAGNÓSTICO - A ÚLTIMA INVENÇÃO DA MEDICINA








"OS INVENTORES DAS DOENÇAS" - JÖRGE BLACH - EDIÇÃO DO SINDICATO DOS ENFERMEIROS - SE


Um SNS de qualidade não é compatível com o actual ministro


Guimaraes_Miguel
Em entrevista ao nosso jornal, Miguel Guimarães, presidente da Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos, não hesita em afirmar que um Serviço Nacional de Saúde de qualidade não é compatível com a manutenção no cargo do actual ministro, a quem acusa de ter menosprezado de forma inaceitável doentes e profissionais de saúde. Diz, sem papas na língua, que na gestão de Paulo Macedo, as pessoas foram substituídas por indicadores de gestão e a desumanização ganhou terreno, alimentando o caos que por estes dias preenche os noticiários.
Defende que os médicos portugueses têm de ser melhor remunerados e tratados com a dignidade que merecem, sob pena de dia após dia serem mais os que optam por exercer além-fronteiras. Apontado por muitos como tendo o perfil que os tempos exigem a um bastonário, não descarta a possibilidade, condicionando-a à conjugação de um conjunto de variáveis de onde destaca as futuras competências e capacidade de intervenção da Ordem dos Médicos que resultarem dos novos estatutos… Neste momento alvo de revisão.
Jornal Médico | Defendeu recentemente que não é possível manter um SNS de qualidade e ao mesmo tempo manter o actual ministro. Está realmente convencido de que assim é?
Miguel Guimarães | O ministro da Saúde, ao abrigo do mito da sustentabilidade do SNS e à boleia do memorando de entendimento imposto pela troika, definiu como prioridade para o seu mandato a redução drástica do orçamento do Estado para a Saúde, o que conduziu a um incompreensível desinvestimento baseado em cortes “cegos” e com menosprezo inaceitável pela qualidade e humanização dos cuidados de Saúde. A sua preocupação centrou-se essencialmente nos números e nos indicadores de gestão e não nas pessoas e na qualidade. E esta situação foi integralmente assimilada por muitos dos seus colaboradores a diversos níveis. Esta é a política de Saúde do ministro Paulo Macedo. Esta é a sua missão no Ministério da Saúde. Esta é a sua imagem de marca. De resto, todos os estudos que têm sido publicados e apresentados nos últimos anos apontam para uma deterioração preocupante da qualidade do SNS. Por isso não acredito numa mudança estratégica na política de Saúde, centrada nas pessoas e na qualidade, sob a liderança do actual ministro.
JM | A falta de profissionais tem sido apontada como uma das principais causas das situações de caos que se viveram em alguns serviços de urgência, de Norte a Sul do País… A situação é assim tão alarmante?
MG | A situação é alarmante por vários motivos. Desde logo, por deficiente organização e planeamento do trabalho dos profissionais de Saúde a que se associam escalas de serviço de urgência incompletas e sem o reforço obrigatório nos meses habitualmente mais problemáticos. Adicionalmente, em alguns casos, não existem equipas médicas organizadas e entrosadas, como consequência da contratação de médicos tarefeiros através de empresas prestadoras de serviços em detrimento da abertura de concursos públicos para a contratação dos médicos necessários. As empresas prestadoras de serviços não garantem muitas vezes os acordos realizados, a qualidade nem sempre é assegurada, a responsabilidade não tem face e o incumprimento não é punido. Concomitantemente, a associação explosiva entre a contenção de custos (para obter melhores resultados na gestão dos números), a redução drástica da composição das equipas de Saúde e a imposição de sobreposição de tarefas hospitalares, agravam ainda mais a situação. Se agregarmos a este conjunto de factores o desinvestimento no papel fundamental dos Cuidados de Saúde Primários, com encerramento de centros de saúde e serviços de atendimento alargado ou permanente, o desinvestimento nos serviços de internamento hospitalares, acompanhado do encerramento de milhares de camas, a ausência de uma aposta clara nos cuidados continuados que permitiria descongestionar os internamentos hospitalares e consequentemente os serviços de urgência, e a destruição dos cuidados de Saúde de proximidade ao nível dos pequenos hospitais concelhios e ao nível da medicina privada com a imposição de regras inaceitáveis aos consultórios e pequenas clínicas médicas, “empurrando” os doentes para os grandes hospitais públicos e privados, fica substancialmente explicada a história clínica do caos vivido nas urgências hospitalares.
JM | A verdade é que o número de médicos afectos ao SNS tem vindo a aumentar consistentemente, desde 2008, tanto nos CSP, como nos Hospitais, de acordo com o último balanço social do Ministério da Saúde… Como explicar a contradição?
MG | Em primeiro lugar, vamos partir do princípio de que o balanço social do MS 2013, elaborado pela ACSS, que refere está correcto. E isto porque os dados disponibilizados pelas várias fontes do Ministério da Saúde são muitas vezes contraditórias entre si. No balanço referido, e entre 2011 e 2013 o número de médicos aumentou muito ligeiramente tendo diminuído em contrapartida e de forma mais substancial o número de enfermeiros e o número de técnicos de diagnóstico e terapêutica. Em segundo lugar, o estudo de evolução prospectiva de médicos no sistema nacional de Saúde, coordenado pela Prof.ª Paula Santana e publicado em 2013, revela-nos alguns dados preocupantes que podem ajudar a compreender a contradição.
Por exemplo, em quase todas as especialidades os médicos com mais de 50 anos são a clara maioria. Por exemplo, na Anestesiologia e na Medicina Interna são 56%, na Radiologia são 60%, na Patologia Clínica são 81%, na Cirurgia Geral são 69%, na Medicina Geral e Familiar são 80%. Por outro lado, entre 2002-2011 aumentaram em 8,3% o número médicos hospitalares, mas diminuíram em 10.9% o número de médicos de Medicina Geral e Familiar e em 24,4% o número de médicos de Saúde Pública. Por outro lado, o número de médicos nos internatos médicos aumentou 36,1%, o que significa para quase todas as especialidades uma capacidade de reposição superior a 20%. Em terceiro lugar, o estudo publicado pela ACSS em 2011 (“Actuais e Futuras Necessidades Previsionais de Médicos – SNS) revela-nos uma insuficiência de médicos em alguns hospitais e um excesso de médicos noutros hospitais. Aos resultados de todos estes estudos, e para compreender melhor a contradição, temos que adicionar as alterações realizadas nos últimos anos ao nível dos Cuidados de Saúde de proximidade e, em particular, ao nível da Medicina Geral e Familiar, como já referido anteriormente. A redução brutal ao nível do número e do valor das horas extraordinárias que condicionou de forma marcada o funcionamento dos serviços de urgência. A assimetria acentuada na distribuição dos médicos que não respeita minimamente critérios de proporcionalidade ou de equidade, que se tem agravado nos últimos anos, e tendencialmente concentra a maioria dos médicos nos grandes centros urbanos. E, finalmente, a incompreensível falta de organização e planeamento dos responsáveis políticos.
JM | O facto de os médicos de família já quase não “fazerem bancos” pode de algum modo explicar a situação de “pré-colapso” a que se chegou?
MG | Não. Os médicos de família não têm que fazer “bancos”. Os médicos de família têm que assegurar os Cuidados de Saúde Primários que constituem a pedra basilar do nosso SNS. De resto, se não tivessem sido encerrados vários centros de saúde e horários alargados de atendimento e serviços de atendimento permanente, a resposta dos Cuidados de Saúde Primários a situações clínicas agudas não urgentes teriam seguramente evitado a situação de “pré-colapso” a que se chegou.
JM | Outra crítica recorrente é a da alegada falta de resposta dos Cuidados de Saúde Primários (CSP) às situações de doença aguda não emergente. “Enquanto a reposta dos Cuidados de Saúde Primários não for a adequada, as urgências hospitalares vão estar permanentemente congestionadas em períodos de maior procura”, justificou, há dias, a Ordem. O que se defende exactamente?
MG | Tal como já foi abordado, os doentes com situações clínicas agudas não urgentes deveriam recorrer em primeira instância aos Cuidados de Saúde Primários. Mas, para que os cidadãos possam optar pela via referida é necessário, em primeiro lugar, que exista disponibilidade alargada ou permanente dos Cuidados de Saúde Primários para atender os doentes (o que foi seriamente limitado pelas opções políticas de encerramentos de centros de saúde e serviços de atendimento permanente), em segundo lugar, que os serviços de atendimento alargado/permanente estejam minimamente equipados para que possam dar uma resposta eficaz à imensa maioria das situações clínicas, em terceiro lugar, que seja implementada uma campanha de informação inteligente e global sobre as principais situações clínicas que permita aos portugueses tomar decisões informadas no momento de recorrer aos cuidados de Saúde.
JM | Como resolver o insólito de 78% dos recursos humanos da Saúde estarem nos hospitais e apenas 22% nos CSP? Mais médicos? A Ordem tem acenado para o perigo de desemprego a manter-se o actual número de vagas para a especialidade de MGF…
MG | A percentagem relativa da especialidade de MGF versus todas as outras especialidades hospitalares é variável de acordo com vários factores, e depende da política de Saúde implementada, das opções estratégicas e de planeamento, e das necessidades previstas de acordo com a frequência das patologias e planos específicos de prevenção de doenças. Os estudos já mencionados anteriormente permitem-nos ter uma ideia aproximada das necessidades de médicos nos hospitais, nos Cuidados de Saúde Primários, nos cuidados continuados, nos cuidados paliativos e na Saúde pública. De qualquer forma, a relação entre a MGF e as outras especialidades médicas deverá rondar os 25/75 %. É verdade que, neste momento, existem portugueses sem médico de família. Situação que resultou da falta de planeamento na formação ao longo dos anos, acompanhada do elevado número de médicos que optou nos últimos anos pela reforma antecipada devido às alterações penalizadoras das condições das reformas impostas pela austeridade assumida. Neste momento, o número elevado de médicos internos de MGF em formação são claramente suficientes para resolver a situação actual incluindo as reformas que entretanto aconteçam. O número relativo de vagas para as diferentes especialidades médicas deve ser aferido e adaptado em função das capacidades formativas e das necessidades do país.
JM | Aqui há dias tivemos a “crise” dos anestesiologistas, com o Ministro a afirmar que não se opera mais porque há falta destes especialistas… E o colégio da especialidade a garantir que não só tem mais membros, como se opera mais… Ainda que muitos tenham emigrado. Em que é que ficamos?
MG | Ainda bem que me coloca esta questão. O ministro da Saúde tem sabido gerir publicamente, muitas vezes de forma abusiva e utilizando os médicos como bode expiatório, as opções erradas da sua política de Saúde. Todos os anos afirma que se fizeram mais consultas e mais cirurgias. E depois, devido a uma qualquer crise num hospital público, dispara de imediato dizendo que não se opera mais porque há falta de anestesiologistas. E cria um facto político, que obrigou o Colégio de Anestesiologia a esclarecer publicamente a situação salientando que existem hoje mais 20% de anestesiologistas e mais 33% de cirurgias no SNS que há 8 anos. Os números publicados pelo ministro da Saúde em princípio estarão correctos. O que desde logo encerra a polémica e responde à sua pergunta. No entanto vale a pena fazer uma pequena reflexão. A polémica sobre a falta de anestesiologistas envolveu sobretudo hospitais do sul do país. A especialidade de anestesiologia teve uma evolução muito significativa nos últimos anos desenvolvendo novas competências e alargando as suas funções, o que criou a necessidade de mais anestesiologistas nas unidades de Saúde. Por outro lado, esta situação levou a que a Ordem dos Médicos aumentasse em um ano o internato da especialidade de Anestesiologia (passou de 4 para 5 anos). O agravamento das condições de trabalho e remuneratórias (em muitos casos com perdas superiores a 30%) ‘empurrou’ muitos médicos para a emigração e para o sector privado. As alterações introduzidas nos novos horários de trabalho obrigam a que uma parte substancial do trabalho dos médicos possa ser realizada no serviço de urgência (até 45% do tempo) em prejuízo da actividade programada (como por exemplo cirurgias). Ainda existem muitos médicos no sector público com horários de 20 horas semanais, sobretudo em algumas especialidades que o ministro considera carenciadas. As horas extraordinárias foram reduzidas a mínimos históricos quer no número de horas permitido quer no valor da hora extra. Os concursos regionais fechados para a contratação de médicos especialistas têm constituído uma verdadeira aberração a vários níveis (que podemos escalpelizar se assim o entender) com tempos de colocação que ultrapassam em muitos casos os 12 meses. Em resumo, apesar de todas as dificuldades criadas pelo ministro, os especialistas de anestesiologia têm dado um contributo inestimável para os indicadores de produção hospitalares conhecidos.
JM | Com o País de mão estendida, deprimido, faz sentido pedir para os médicos portugueses salários idênticos aos que se praticam, por exemplo, em Inglaterra, para os manter por cá?
MG | Os médicos portugueses são mal remunerados e não têm sido tratados com a dignidade que merecem. Deveriam ser remunerados de acordo com o nível de responsabilidade que têm na sociedade civil (o que aliás é bem patente na comunicação social). Na Europa, com excepção da Grécia, apenas alguns dos países de leste têm remunerações inferiores às praticadas em Portugal. Não quero dizer com isto que os médicos em Portugal deveriam ter salários idênticos aos que se praticam em Inglaterra (em média cerca de 3 vezes superiores). Mas deveriam ser claramente melhorados. De resto, a contratação de médicos não especialistas a Cuba envolveu valores muito superiores (cerca de 2-3 vezes) aos praticados em Portugal. Repare que manter e apostar na juventude e nos nossos melhores valores é dar um passo em frente para acabar com a depressão e responder positivamente aos desafios económicos e financeiros que temos pela frente.
JM | Como avalia o desperdício que constitui Portugal estar a deixar sair profissionais que custaram ao País centenas de milhões de euros a formar? Deveria ser criada, nos cursos de Medicina, uma “salvaguarda de investimento” do tipo “permanência no SNS durante pelo menos “x” nº de anos?
MG | Um desperdício traduzido em muitas centenas de milhões de euros, para manter um modelo de financiamento das Universidades que já não faz sentido no momento actual e agradar à sociedade civil que decide eleições. Uma pequena reflexão. As capacidades formativas dos cursos de Medicina estão claramente ultrapassadas (em largas centenas de vagas) e neste momento a formação prática dos estudantes de Medicina está a ser seriamente prejudicada. Portugal não precisa de formar anualmente mais de 1500 médicos para responder correctamente e já em excesso às necessidades do país (todos os estudos realizados sobre esta matéria apontam num sentido semelhante). No momento actual, o Estado português não consegue garantir “lugar” no SNS para todos os especialistas resultantes de todos os jovens médicos que se formam no país (cerca de 1900). E por isso, a “salvaguarda de investimento” não faz sentido. O que faz sentido é planear correctamente as necessidades do país, investir fortemente na qualidade da formação pré e pós-graduada e atrair os jovens especialistas com condições de trabalho que lhes permitam aplicar todo o seu potencial e ajudar a desenvolver a Medicina e a qualidade dos cuidados de Saúde. É isto que fazem nos países ricos. E quando precisam de mais alguns médicos contratam-nos externamente aos países pobres como nós, que continuam a não saber combater o desperdício e preferem continuar com medidas de austeridade que cada vez afundam mais o próprio país.
JM | Aqui há dias foi anunciado um “pacote” de medidas visando cativar os médicos. São suficientes?
MG | É positivo que o ministro se tenha finalmente lembrado de tentar resolver o problema das áreas mais carenciadas e desfavorecidas. No entanto, as medidas anunciadas não me parecem suficientes. O pacote de medidas proposto para fixar médicos na zonas mais carenciadas não tem consistência temporal (passa rapidamente dos 900 euros para os 275 euros) nem é suficientemente mobilizador: No caso dos médicos aposentados apenas alarga o período de contratação dos mesmos sem qualquer benefício adicional temporal que estimule a procura, e no caso da mobilidade parcial para locais que distem mais de 60 Km entre si terá que ser avaliado caso a caso, sendo que os 200 euros de ajudas de custo terão um peso diferente em função das distâncias consideradas, centrado no tempo gasto em viagens, em combustível, em portagens, na alimentação e eventual estadia, e nas complicações subjacentes a este tipo de situação. A proposta global apresentada não me parece que evite a “fuga” de médicos para o sector privado ou para outros países. Quando se pretende fixar médicos ou outros profissionais em áreas mais carenciadas temos que ser mais convincentes tal como acontece noutros países. Por exemplo, uma redução substancial nos impostos directos durante 5 ou mais anos, facilidades objectivas na habitação, prioridade na colocação da família directa, melhoria substancial das condições de trabalho com acesso fácil a praticar uma Medicina de acordo com as boas práticas médicas, possibilidade de desenvolver projectos de investigação clínica ou desenvolvimento de técnicas específicas, possibilidade de colocação de outros profissionais que permitam constituir um grupo de trabalho coeso e com alguma massa crítica, etc.
JM | Sustentabilidade. Nos últimos tempos não se fala de outra coisa… O actual modelo de SNS é sustentável?
MG | Já esperava esta pergunta. O ministro da Saúde conseguiu, desde o primeiro dia e de forma inteligente introduzir a questão da sustentabilidade do SNS. E porquê? Porque a sua missão e seu objectivo final, tal como foi dito no início desta entrevista, centrou-se na redução drástica do orçamento do Estado para a Saúde sem qualquer preocupação pela qualidade e humanização dos cuidados de Saúde. Perguntar se o SNS é sustentável é o mesmo que perguntar se o nosso país é sustentável. Falamos muito em sustentabilidade do SNS mas não falamos tanto em sustentabilidade de outras áreas de intervenção pública. Em 2013 o orçamento de estado para a Saúde foi cerca de 5% do PIB. No mesmo ano a execução orçamental geral per capita foi de 5.446,7 euros. E o orçamento per capita para a Saúde foi de 825,1 euros. Um dos valores mais baixos dos países da OCDE. De acordo ainda com os dados mais recentes da OCDE, as medidas de contenção da despesa efectuadas pelo Governo no sector da Saúde fizeram com que Portugal acabasse por cortar o dobro do que era exigido no memorando de entendimento com a troika. O estudo da Universidade Nova de Lisboa realizado recentemente sobre a sustentabilidade na Saúde evidenciou de forma clara que cortes substanciais na Saúde têm um reflexo negativo marcado nos doentes e na economia nacional. Por exemplo, o estudo salientou que em 2014, cada português faltou em média cinco dias ao trabalho por motivo de doença, o que representou um prejuízo de cerca de dois mil milhões de euros por via dos salários. Por isso, não me parece que o caminho a seguir seja de reduzir ainda mais o orçamento de Estado para a Saúde mas sim o inverso. Temos que apostar claramente na sustentabilidade do SNS investindo e não subtraindo. Temos que promover a Saúde e o envelhecimento activo para reduzir a carga de doença e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Temos que apostar fortemente na prevenção da doença. Temos que introduzir um factor de combate inteligente ao desperdício. Temos que introduzir um factor de incentivo para melhorar a qualidade dos cuidados de Saúde. Temos que promover uma reforma do SNS que conserve o seu património genético e permita melhorar os cuidados de proximidade e a qualidade da Medicina.
JM | Qual o papel a desempenhar pelo sector privado?
MG | O sector privado tal como o sector social terão sempre, no contexto da organização do nosso sistema de Saúde, um papel complementar do SNS. A este propósito lembro que actualmente o sector privado representa cerca de 40% do valor da despesa em Saúde (e que resulta directamente do bolso dos portugueses).
JM | Inovação… Outra palavra “mágica” nos tempos que correm. Deve ser integrada a qualquer custo? Como compatibilizar a máxima “uma vida não tem preço”… Com o facto de o país não ter dinheiro para suportar alguma da tecnologia que já se vislumbra no horizonte?
MG | A inovação terapêutica e tecnológica constitui um desafio que todos temos que ganhar. Temos que distinguir claramente a “verdadeira” da “falsa” inovação. Deve ser revista e encontrada uma forma socialmente mais justa de estabelecer o preço da inovação terapêutica ou tecnológica. A introdução da inovação deve ser correctamente avaliada e deve existir partilha do risco. A investigação científica e tecnológica tem custos demasiado elevados que devem ser discutidos e avaliados de forma aberta e transparente. O Estado português deve investir e promover internamente um maior desenvolvimento de linhas de investigação que possam contribuir para diminuir o preço da inovação. Em algumas situações limite (de medicamentos excessivamente caros) é lícito e desejável que seja promovida uma “central de compras” a nível europeu ou que reúna alguns países interessados, no sentido de encontrar um preço mais equilibrado e justo para algumas terapêuticas inovadoras. Seja como for, os médicos estarão sempre obrigados a cumprir o seu Código Deontológico, actuando de acordo com as boas práticas médicas.
JM | Tem sido apontado como “próximo Bastonário”. Exclui a possibilidade ou…
MG | O cargo de Bastonário é um cargo de grande responsabilidade que obriga a uma grande capacidade de liderança e de intervenção e a uma disponibilidade quase permanente. Neste momento a Ordem dos Médicos é bem liderada pelo Prof. José Manuel Silva que ainda tem à sua frente quase dois anos de mandato. Actualmente estão a ser discutidos os Estatutos da Ordem dos Médicos. A sua versão final ditará as futuras competências e capacidade de intervenção da Ordem dos Médicos. A possibilidade de uma candidatura a Bastonário dependerá da integração de todas as variáveis referidas. Temos que esperar!
NB: E é bem feita; ainda querem mais...
Com amizade,
José Azevedo

Sem comentários:

Enviar um comentário