sábado, 27 de setembro de 2014

SINDICATO E ACÇÃO SINDICAL - A GREVE, LIÇÃO 4

LIÇÃO Nº 4

OUTRAS FORMAS DE PRESSÃO SINDICAL

O termo "boicote" provém de um tal capitão Boycott, administrador de 'uma feitoria inglesa, que no século 17º, devido ao seu comportamento inaceitável, para com os colonos, se viu privado de toda e qualquer relação social. Era ignorado, quer solicitasse um serviço qualquer (uma viagem, a um copo de água), quer dirigisse a palavra a alguém. Viu-se obrigado a partir para a América e a mudar de nome, devido ao clamor suscitado por esta nova forma de sanção social'.

O "Boicote"

Consiste em impedir as relações sociais de uma pessoa ou de uma empresa, com outras pessoas ou empresas; é uma espécie de incomunicação social ou económica, é uma privação de relações.
Sob o ponto de vista sindical interessa-nos, principalmente, nos seus aspectos económicos.
O boicote pode ser primário ou secundário.
Primário é o que se exerce directamente sobre a pessoa ou pessoas com que se entra em conflito;. Por ex: quando o Sindicato intima os seus filiados a não solicitarem trabalho junto de certos empresários.
O secundário é aquele que se exerce contra terceiros a fim de tornar mais efectivo o boicote primário.
Um exemplo de boicote primário foi o dos trabalhadores americanos contra a empresa Pulman.
Outros exemplos: uma fundição, para combater uma greve dos seus trabalhadores, cede o seu trabalho a outras fundições da zona. Os trabalhadores destas boicotam essa atitude, recusando trabalhar o material da primeira.
Em 1942, os trabalhadores do porto da ilha Lewis negaram-se a carregar as encomendas das empresas têxteis locais, apoiando a agitação dos respectivos trabalhadores.
Outro tipo de boicote também muito importante é o boicote aos produtos, isto é, a atitude dos consumidores que não compram determinadas mercadorias produzidas por empresas com as quais os trabalhadores estão em conflito. Pode ser extensiva a outras pessoas, para além dos filiados do Sindicato, que estão indirectamente implicados no caso (familiares dos trabalhadores) e mesmo outras, ainda que nada tenham a ver com essa luta.
Um Sindicato de fabricantes de cerveja propõe à empresa a negociação  de um contrata de trabalho, que ela nega. O Sindicato dirige-se ao público consumidor - constituído, na sua maior parte, por trabalhadores - e declara que o produto daquela fábrica é "desonesto" e não deve ser comprado por eles, os trabalhadores.
Neste caso, a finalidade da propaganda é conseguir que os comerciantes não comprem o produto, quer, porque não é procurado pelos trabalhadores e suas famílias, quer por medo que estes deixem de ser seus clientes.
Num plano mais amplo, a AFL/CIO americana distribui entre os seus Sindicatos uma "lista negra" de produtos "indesejáveis", provenientes de fábricas, cujos dirigentes se negam a aceitar as reivindicações sindicais. As listas têm por título "Não favorecemos...".
Colocam etiquetas nos produtos dizendo: "Feito por trabalhadores não sindicalizados", como acontecia nas marcas de Cigarros Marlboro e Winstam. Este é um convite ao boicote  a esses produtos, por trabalhadores que reconhecem a importância dos Sindicatos na vida dos trabalhadores.
De notar que, por exemplo, em Itália, o boicote está expressamente proibido. 
No Código Penal italiano , de 1930, estabelece-se no seu art.º 507º: "Quem, para conseguir qualquer dos fins aludidos nos artigos 503º, 504º e 505º, valendo-se da propaganda ou da autoridade e força dos partidos, das coligações e associações, induza uma ou mais pessoas a não cumprir contratos de trabalho, a não fornecer materiais ou instrumentos necessários à produção, a não adquirir produtos industriais ou agrícolas, será sancionado com pena de prisão até 3 anos. Se ocorrerem actos de violência ou ameaças, a prisão será de 2 a 6 anos.
O boicote, raramente se emprega a fim de apoiar o processo de contratação; geralmente é utilizado como represália.
É uma forma de luta mais difundida nos Estados Unidos que na Inglaterra, onde uma tentativa , dos sapateiros de Londres, de boicotar o estilo americano, não teve êxito.
No entanto, em 1943, o Sindicato inglês de condutores de autocarros incitou os seus sócios ao boicote, como apoio aos trabalhadores da confecção, que estavam em greve. Publicou no seu jornal uma carta-tipo que cada sócio devia enviar ao empresário em conflito, declarando que nem ele, nem pessoas alguma da sua família, adquiriria produtos daquela empresa, enquanto se negasse a satisfazer as reivindicações dos trabalhadores.
De igual modo, em 1939-40, os Sindicatos ingleses apoiaram oficialmente um boicote que lhes foi solicitado. Tratava-se de um conflito com certa empresa têxtil, que se negara reconhecer o Sindicato e a negociar um contrato.
No Conselho Geral do TUC (Trade Union Congress), incitaram-se, através da imprensa, todos os  filiados, familiares e amigos a não comprarem senão nas empresas que tinham aceitado tal contrato.
Uma das formas mais conhecida de boicote, é o acto de negar-se a tocar produtos "corrompidos" ou "negros". É particularmente eficaz, no sector dos transportes, onde a sua utilização chegou a ser de tal maneira excessiva, que pôde ser considerada o "ponto de menor resistência" das empresas.
Este tipo de boicote foi muito empregado como arma política. Em 1919, trabalhadores ingleses recusaram-se a carregar armas destinadas às tropas polacas, que iriam combater as soviéticas (ao que parece, os trabalhadores do porto de Varsóvia realizaram uma acção paralela).
Em 1937-38, os estivadores de Liverpool, Glasgow e Southampton negaram-se a carregar armas para o Japão combater a China. Em todos os países houve exemplos semelhantes. Através da Federação Internacional dos Trabalhadores de Transportes, organizaram-se acções de solidadriedade para impedir o transporte de carvão, em Inglaterra, França, Alemanha e Escandinávia, durante uma greve geral.
Os Sindicatos Neozelandeses e australianos, em 1947, opuseram-se ao carregamento de armas para a Indonésia e ameaçaram não descarregar produtos "negros" provenientes dos Estados Unidos, se o Presidente Truman usasse a frota americana para boicotar a greve dos marinheiros.
O Sindicato utiliza a sua força não só para exercer represálias, mas também para exaltar qualquer facto, o que favorece o seu prestígio e aumenta essa mesma força. Eis por que, para além do boicote, encontramos o seu contrário; o sistema das "listas brancas".
Este sistema - difundido na América do Norte - consiste na aplicação a um produto de uma marca ("label" -etiqueta-) que mostra que a empresa que o fabrica está em boas relações com o Sindicato. A "lista branca" ou "label" mais utilizada na América do Norte, que noutras partes do mundo, embora também se verifique no Canadá e, mais estritamente, na Europa.
Em Inglaterra vigoram "listas brancas" na indústria das artes gráficas, enquanto que o "label" só apareceu no calçado e a partir de 1912. Em 1956, o Congresso das Tade Unions  (TUC) aprovou uma cláusula em que se afirmava que já tinha chegado a altura em que "todos os trabalhadores serão chamados a dar a sua preferência, nas compras dos artigos fabricados pelos filiados dos Trade Unions";
Também se sugeria que fosse aplicado um "label", pelo próprio Conselho Geral. Isso aconteceu em 1928, mas o significado desse acto foi puramente histórico. Considera-se que este sistema é de difícil concretização, porque os produtos, antes de serem vendidos, passa por várias empresas, não igualmente merecedoras do "label", ou "etiqueta".

A "Sabotagem"

A Sabotagem é um instrumento de pressão - geralmente condenado por lei - que consiste em destruir total ou parcialmente edifícios, máquinas, aprovisionamentos, ferramentas ou produtos vários duma empresa. O termo parece derivar da palavra francesa "sabot", que significa tamanco.
As operárias francesas danificavam as máquinas com os seus tamancos, a pontapé.
Foi uma das formas muito utilizadas nos primeiros passos do movimento sindical e que hoje está praticamente posta de lado. Os trabalhadores viam nas máquinas inimigos que lhes roubavam os postos de trabalho.
A sabotagem, cujo exemplo mais conhecido é na destruição das máquinas Ludd, "Ludismo"revela um movimento sindical enfraquecido, para o qual - como na França dos fins do século 19º - manter uma greve prolongada ou combater os "esquiroles" era um problema quase impossível de solucionar.
A sabotagem constituía então, a forma mais clara de "acção directa" e costumava substituir ou acompanhar uma greve.
Em todo o caso é um método utilizado em situações demasiado explosivas de vingança e de represália, em que as pessoas reagem irracionalmente.
Distinguem-se duas formas de sabotagem:
A activa (prejuízos na maquinaria ou prejuízo sobre os produtos através da publicidade de práticas comerciais fraudulentas);
A passiva.
Detenhamo-nos, no primeiro caso. Entre os episódios deste tipo verificados, em Inglaterra, pode assinalar-se o dos electricistas em Albert Hall, em 1918, que como protesto por não lhes ter sido cedida a sala para uma reunião sindical, desligaram a energia eléctrica da região.
Também se referem casos em greves de mineiros: discutiu-se muito no Sul do país de Gales se se havia de inundar as minas, o que só foi concretizado uma vez, em 1910.
A greve dos ferroviários ingleses de 1919 foi acompanhada de alguns actos de sabotagem. Em todo o caso, nunca foram autorizadas pelo Sindicato; este, antes pelo contrário, condenou-os.
Pode ser considerada sabotagem um tipo de greve que consiste em permanecer no posto de trabalho e fazer tudo mal.
Por exemplo; o pessoal de teatro e salas de projecção de New York conseguiu um novo contrato de trabalho por 2 anos e um aumento salarial de 15%, efectuando uma campanha (não aprovada pelos Sindicatos) durante a qual os filmes eram projectados ao contrário, ouviam-se ruídos estranhos e confundiam-se, propositadamente, os títulos.
Opor-se à aceleração do ritmo de trabalho, pode também implicar actos de sabotagem. 
Por vezes, os trabalhadores obrigados a "render" mais no mesmo tempo, sem serem por isso compensados (aceleração da cadeia de montagem, redução dos períodos de empreitada ou SIGIC na saúde). Em tais casos, quando a aceleração ultrapassa certo limite, um trabalhador deixa cair algum objecto, "acidentalmente", (ou cospe nas compressas) sobre a linha. Enquanto a avaria é reparada, a cadeia pára e é possível repousar um pouco.
Alguns danos causados nas instalações ou nos produtos, embora não sejam considerados sabotagem, significam sempre um certo descontentamento dentro da empresa.
Manifestações como as dos ferroviários de Steatan, que em Agosto de 1946, entraram em greve, para chamar a atenção do público, para o péssimo estado das carruagens; ou as dos trabalhadores da construção, que se negaram  a construir em ritmo, demasiadamente acelerado e com materiais de má qualidade, podem revestir formas de sabotagem, porque no fundo se prejudica um dos "bens" da empresa, o bom nome, fonte de clientela e, portanto, de lucros.
Outro exemplo interessante é o que os anglo-saxónicos chamam "open mouthed sabotaje" ou "sabotagem de boca aberta", isto é;
um ataque ao prestígio do empresário. Os empregados de limpeza de determinada empresa de Roma, em 1954, estando de greve, distribuíram panfletos à população, onde se afirmava que os camiões utilizados para retirar o lixo eram também empregues no abastecimento de fruta e hortaliça aos mercados.
Há quem considere um acto de sabotagem passiva a lentidão voluntária no trabalho, o que atrasa o processo de produção e reduz as margens de lucro do empresário. Esta forma de pressão é muito semelhante à "não-colaboração" ou à "obstrução".
Ilustremos com mais um caso:
com os trabalhadores do porto de Glasgow, em greve (1889), os empresários recusavam-se a aumentar os salários e furaram a greve empregando trabalhadores agrícolas "esquiroles".
Os estivadores propuseram o recomeço do trabalho se aqueles esquiroles fossem despedidos.
Os empresários aceitaram.
O Sindicato dos trabalhadores portuários declarou então, que se os empresários se tinham mostrado satisfeitos com o trabalho dos esquiroles agrícolas, homens sem eficácia alguma, com a reincorporação dos antigos trabalhadores nada se modificaria. Esta forma de pressão que durou 3 dias conseguiu que as reivindicações fossem aceites. 

Encerramento e "Listas Negras"

Aos meios de pressão utilizados pelos trabalhadores correspondem, como já vimos, variados meios de pressão usados pelos empresários.
O mais importante é o encerramento (lock out) que consiste em suspender a actividade da empresa por determinado período, normalmente, para obter uma redução salarial ou outra vantagem na contratação, para impedir uma subida dos mesmos ou outro prejuízo a nível económico, ou ainda como oposição a uma greve declarada pelos trabalhadores.
O encerramento, na prática, não é mais que o afastamento dos trabalhadores da empresa, sem que durante o mesmo, lhes seja pago algum salário.
O direito ao encerramento não está reconhecido na Constituição Italiana (nem na Portuguesa), que, por outro lado, reconhece  o direito à greve.
Outra forma de pressão por parte dos empresários é a utilização arbitrária do direito ao despedimento com fins de intimidação ou represália.
Quando tratarmos da agitação na Pullman daremos exemplos claros quer de encerramento, quer de despedimentos por represália.
Nos hospitais e centros de saúde usam os mesmos métodos intimidatórios, apesar de serem ilegais, mas produzem o mesmo efeito, pelo menos psicológico que inibe os Enfermeiros de lutar.
Outra forma de pressão ainda são as "listas negras", listas de nomes de trabalhadores "não convenientes" e que circulam entre os empresários.

Estas notas sobre sindicalismo destinam-se tão-só a colmatar uma falha social que o nosso ensino normal e profissional não comporta.
E numa geração que nasce sem saber nem sentir o que se passou com a Enfermagem, antes de poderem eleger, nas vagas disponíveis a licenciatura de Enfermeiro, esta ajuda é muito útil para poderem libertar-se da manipulação de certos abutres estejam de que lado estiverem.
Para poderem optar livremente;
Para poderem ser úteis, a si próprios, têm de saber estes conceitos deixados por quem sofreu muitas repressões para conquistarem melhores condições de vida e de trabalho.
Se há alturas em que é preciso agir, os Enfermeiros estão no pico dessa necessidade.
Vamos acabar com as farsas e os farsantes ou farsolas.

Com amizade 
José Azevedo


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