quarta-feira, 17 de maio de 2017

AS FÁBULAS E O COMILÃO

Os membros e o estômago

Em recente pesquisa sobre as parábolas de Jesus, dei de cara com o apólogo de Menênio Agripa. Sigo La Fontaine na fábula "Les Membres et l´Estomac". Ele conta que a classe inferior (plebe) de Roma se revoltou contra o Senado, achando que este era formado de parasitas, que só sabiam explorá-la. Assim começou a debandada; todo o povinho estava largando a metrópole. Mortal sangria para Roma. Foi então que o grande orador, Menênio Agripa, dirigiu-se ao pessoal com o seguinte apólogo: O estômago, conforme tinham concluído os outros membros do corpo, só fazia receber o serviço de todos sem vantagem alguma para eles. Comer, comer era o que ele sabia fazer. Então, que se arme uma greve geral contra o inútil explorador. As mãos não pegariam mais nada; os pés não dariam um passo. O preguiçoso que se arrumasse. Dito e feito. Nada de comida para o estômago. Resultado: com pouco tempo, a fraqueza foi tomando conta do corpo todo, de fora a fora; nada de sangue para renovar as forças. Assim compreenderam os demais membros a importância do estômago e suspenderam a greve suicida. Menênio Agripa acertadamente aplicou o caso ao Senado: este parecia inútil, consumidor ocioso dos frutos do trabalho do povo, mas na realidade, ele era indispensável para o bem comum; sem o Senado, suas diretivas para a atividade de todas as classes, Roma não poderia subsistir. O povo até então revoltado, entendeu e todos regressaram para dentro dos muros.
Isso foi lá uns quinhentos anos antes de Cristo. Como se trata, porém, de coisa sempre atual, pergunto eu: com um Senado tão lerdo, por meses encalhado na lama de Renan Calheiros, seria possível aparecer entre os nossos maiores comunicadores alguém que acalmasse com um drible oratório, a indignação do povo, convencendo-o a pagar confiadamente exorbitantes impostos, remunerar alegremente os senadores, porque, como diz belo pensamento: "Para cada um deles mais vale o interesse público do que a própria vida?" No latim com tradução fiel: "Res publica mihi carior est quam vita mea." "A coisa pública me interessa mais do que minha própria vida".
De vez que tocamos no assunto, apreciemos a frase latina com que nossos antepassados ferreteavam o "corporativismo", uma pessoa sem competência na posse de cargos públicos. "Asinus ad lyram": "Um burro (tocando) lira." Numa versão mais adaptada ao nosso meio diríamos: Uma orquestra com um jumento ao teclado. Valeu?!
E desde que nos achamos no viçoso pomar das frases latinas, por que não saborear mais algumas? "Videamus!" Vejamos! Têm chefes, tem gente que, mal alguém abre a boca para desabafar ou se queixar, dá logo a impressão de já saber tudo e lá vem conselho, lá vem desculpa esfarrapada para não atender ao pedido de providência imaginado. Assim não dá. Bom médico não faz assim. Afinal, como reza o ditado: "Cada um sabe onde seu sapato aperta." O latim não diz aperta e sim queima: "Nemo scit, ubi calceus urat, nisi qui eum portat" "Ninguém sabe onde o sapato queima, além daquele que o calça." E um calo como queima!
E por ter falado em médico, muito cuidado com a automedicação e a mania de leigos receitarem remédios. Interessante: quando um remédio nos faz bem, a tentação é prescrevê-lo a todo o mundo com algum sintoma parecido com o de nosso mal. Cuidado! "Quod medicina aliis, aliis est acre venenum": "Remédio para uns, cruel veneno para outros". As doenças não são iguais. Os organismos não são iguais.

ONDE ESTÁ A UNIVERSALIDADE DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO, digo eu...

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FÁBULA: Os membros e o estômago.


As mãos e os pés revoltaram-se um dia: “Trabalhamos tanto, estamos em contínuo lidar e tudo é em proveito do estômago, que aí fica folgado, empregando em vantagem sua quanto adquirimos. Não estamos mais por isso, queremos folgar, e viva o estômago como puder.” Admoestações, rogos, instâncias, nada valeu. O estômago ficou em jejum; mas para logo todo o corpo caiu em debilidade; braços, pernas, pés e mãos foram dos primeiros a sentir um entorpecimento, uma languidez que os assustou; compreenderam que iam morrendo; voltaram, pois ao seu antigo ofício, e dentro em pouco, graças ao condescendente estômago, se acharam restituídos à antiga robustez.

MORALIDADE: Todos somos membros de um vasto corpo, que é a sociedade; cada um exerce funções especiais, mais subidas, mais humildes, porém todas indispensáveis para a prosperidade e até para a existência de todos.

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Variações desta história existem desde a antiguidade clássica.
 Paulo emprega uma delas em Coríntios I 12:14-16.
Uma vez um homem sonhou que suas mãos, pés, boca e cérebro começaram todos a se rebelar contra estômago.
- Sua lesma imprestável! - as mãos disseram - Nós trabalhamos o dia inteiro, serrando, martelando, levantando e carregando. De noite estamos cobertas de bolhas e arranhões, nossas juntas doem e ficamos cheias de sujeira. Enquanto isso, você só fica aí sentado, pegando a comida toda!
- Nós concordamos! - gritaram os pés - Pense só como nos desgastamos, andando para lá e para cá o dia inteiro. E só fica se entupindo, seu porco ganancioso, cada vez mais pesado para a gente carregar.
- Isso mesmo! - choramingou a boca - De onde você pensa que vem toda a comida que você tanto ama? Eu é que tenho que mastigar tudo; e logo que termino, você suga tudo aí para baixo, só para você. Você acha que isso é justo?
- E eu? - gritou o cérebro - Você acha que é fácil ficar aqui em cima,tendo que pensar de onde vai vir a sua próxima refeição? E ainda por cima, não ganho nada pelas minhas dores todas.
Uma por uma, as partes do corpo aderiram às reclamações contra o estômago, que não disse coisa alguma.
- Tenho uma idéia - o cérebro finalmente anunciou. - Vamos todos nos rebelar contra essa barriga preguiçosa e parar de trabalhar para ela.
- Soberba idéia! - todos os outros membros e órgãos concordam - Vamos lhe ensinar como nós somos importantes, seu porco. Assim, talvez você também acabe fazendo algum trabalho.
E todos pararam de trabalhar. As mãos se recusaram a levantar ou carregar coisas. Os pés se recusaram a andar. A boca prometeu não mastigar nem engolir nem um bocadinho. E o cérebro jurou que não teria mais nenhuma idéia brilhante. No começo, o estômago roncou um pouco, como sempre fazia quando estava com fome. Mas depois ficou quieto.
Nesse ponto, para surpresa do homem que sonhava, ele descobriu que não conseguia andar. Não conseguia segurar nada nas mãos. Não conseguia nem abrir a boca. E de repente, começou a se sentir bem doente.
O sonho pareceu durar vários dias. A cada dia que passava, o homem se sentia cada vez pior.
- É melhor que essa rebelião não dure muito - ele pensou - senão vou morrer de inanição.
Enquanto isso, mãos, pés, boca e cérebro só ficavam à toa, cada vez mais fracos. No início, se agitavam só um pouquinho, para escarnecer do estômago de vez em quando; mas pouco depois não tinham mais energia nem para isso.
Por fim, o homem ouviu uma vozinha fraca vinda da direção dos pés.
- Pode ser que estivéssemos enganados - eles diziam. - Talvez o estômago estivesse trabalhando o tempo todo, ao jeito dele.
- Estava pensando a mesma coisa - murmurou o cérebro. - É verdade que ele fica pegando a comida toda. Mas parece que ele manda a maior parte de volta para nós.
- Devemos admitir nosso erro - disse aboca. - O estômago tem tanto trabalho a fazer quanto as mãos, os pés, o cérebro e os dentes.
- Então, vamos todos voltar ao trabalho - gritaram juntos. E, nisso, o homem acordou.
Para seu alívio, descobriu que os pés estavam andando de novo. As mãos seguravam, a boca mastigava e o cérebro agora conseguia pensar com clareza. Começou a se sentir muito melhor.


- Bem, eis aí uma lição para mim - ele pensou, enquanto enchia o estômago de café e pão com manteiga, de manhã. - Ou funcionamos todos juntos, ou nada funciona mesmo.

MORAL DA HISTÓRIA; SE OS MEMBROS PARAM NADA FUNCIONA. PENSA NISTO, COLEGA GREVISTA.

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