Exmo. Sr. Presidente da República Portuguesa
Professor Marcelo Rebelo de Sousa
Cc:
Exmo. Sr. Primeiro-ministro
Dr. António Costa
Exmo. Sr. Ministro da Saúde
Dr. Adalberto Campos Fernandes
Lisboa, 12 Setembro 2018
Assunto: Enfermagem Portuguesa – Expectativas de Desenvolvimento Profissional e Progressões
Rui Carlos Bastos dos Santos, na qualidade de cidadão Português e ciente das funções que V. Exa. desempenha e dos limites das mesmas, vem por esta forma trazer ao V. conhecimento a realidade que se vive na profissão que desempenho honrosamente há praticamente 23 anos. Enfermagem.
Natural de Coimbra, sou desde o final do meu Curso, Enfermeiro do atualmente denominado Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central – Hospital S. José.
É com elevada responsabilidade que faço parte do “nosso” Serviço Nacional de Saúde, que tantos ganhos tem trazido aos Portugueses.
E é neste Serviço Público de Saúde que quero continuar a ter condições para trabalhar.
Naturalmente que, apesar de me sentir um servidor público sou acima de tudo um Profissional com dignidade e valor, e quando falo em valor não me refiro unicamente ao salarial, refiro-me também ao que sinto ser a minha produção de valor e de valores sociais.
O reconhecimento do cidadão que diariamente cuido é por isso fundamental e poderei dizer que tem sido gratificante e compensador, contudo e como o povo costuma dizer este reconhecimento por si só não coloca comida na mesa dos meus filhos.
Será portanto fundamental olhar para a Enfermagem Portuguesa.
Uma realidade, a meu ver triste, que chega a ser confrangedora para tantos que como eu, decidiram escolher esta profissão.
Os Enfermeiros após 1999 realizaram um ano de formação para terem equivalência à licenciatura e desde 2004 “saem” para o mundo laboral como Licenciados. Apesar de auferirem valores dentro das balizas da chamada Carreira Técnica Superior, são descriminados ao terem um valor salarial bastante inferior ao de outros profissionais com idênticas habilitações.
Pergunto, não estará neste caso colocado em causa o princípio básico da igualdade plasmado na Constituição? Tratamento desigual de situações idênticas?
Na melhor das hipóteses, hoje um Enfermeiro Licenciado inicia o seu percurso Profissional no SNS com o valor de aproximadamente 1201,48 euros que, acrescento, é o mesmo valor auferido por qualquer enfermeiro que possua até pelo menos 23 anos de prática clínica.
Pergunto, será natural existir um estado que não compense o desenvolvimento profissional e a experiência?
Lembro, que os Enfermeiros e a Enfermagem são precursores na Administração Pública Portuguesa de mecanismos de avaliação de desempenho. Por isso, nunca nenhum Enfermeiro quis ver valorizada a sua experiência sem ser assente num processo dinâmico e construtivo de avaliação e crescimento efetivo e sustentado do seu desempenho.
Bem sabemos, que por imperativos nacionais, as carreiras da Administração Pública estiveram congeladas desde 2004.
Mas valerá a pena, sobre congelamentos, refletir sobre o programa do atual governo e os compromissos assumidos, podemos ler:“A concretização de uma mais rápida recuperação do rendimento dos trabalhadores do Estado. O fim dos cortes salariais e a reposição integral dos salários da Função Pública durante o ano de 2016, de forma gradual (25% no primeiro trimestre; 50% no segundo; 75% no terceiro; 100% no quarto) e o descongelamento das carreiras a partir de 2018. “
E no Orçamento de Estado de 2018 artigo 18º:
“1 - Para os titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 2.º da Lei n.º 75/2014, de 12 de setembro, são permitidas, nos termos dos números seguintes, a partir do dia 1 de janeiro de 2018 e não podendo produzir efeitos em data anterior, as valorizações e acréscimos remuneratórios resultantes dos seguintes atos:
a) Alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível ou escalão;
b) Promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos, incluindo nos casos em que dependam da abertura de procedimentos concursais para categorias superiores de carreiras pluricategoriais, gerais ou especiais, ou, no caso das carreiras não revistas e subsistentes, incluindo carreiras e corpos especiais, para as respetivas categorias de acesso.
2 - Aos trabalhadores cujo desempenho não tenha sido avaliado, designadamente por não aplicabilidade ou não aplicação efetiva da legislação em matéria de avaliação do desempenho, e sem prejuízo do disposto no artigo 42.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, nas situações por este abrangidas, é atribuído um ponto por cada ano não avaliado, ou menção qualitativa equivalente, nos casos em que este seja o tipo de menção aplicável, sem prejuízo de outro regime legal vigente à data.
3 - Aos trabalhadores cujo desempenho tenha sido avaliado com base em sistemas de avaliação de desempenho sem diferenciação do mérito, nomeadamente sistemas caducados, para garantir a equidade entre trabalhadores, é atribuído um ponto por cada ano ou a menção qualitativa equivalente sem prejuízo de outro regime legal vigente à data, desde que garantida a diferenciação de desempenhos. “
Da leitura conjugada destes dois documentos poderemos inferir que a partir de 2018 a Carreira de Enfermagem seria descongelada, existindo até declarações do Sr. Primeiro-ministro dizendo que os Enfermeiros veriam muitas das suas justas aspirações serem alcançadas com o descongelamento de carreiras da Administração Publica.
Pois bem, na realidade pouco ou nada aconteceu e cada instituição está a proceder da forma como entende ao reposicionamento prometido e legislado.
Elenco nesta missiva, dois dos problemas mais comuns existentes na maioria das instituições sobre descongelamentos:
1 - Enfermeiros que viram o seu ordenado atualizado por força da lei entre 2011 e 2013 de 1200 euros para 1201,48 euros, constituindo esta atualização salarial uma alteração do vencimento base dos Enfermeiros e não uma alteração de posicionamento remuneratório nem de escalão, estão a ver todo o seu tempo anterior a esta data “Zerado”.
Pergunto, será possível “zerar” tempo de desempenho de Enfermeiros que não mudaram de posição remuneratória, antes sim, viram o seu ordenado atualizado em 40 euros por força da lei em vigor? E se tal fosse possível porque há instituições que contaram todo este tempo? Neste poto além de uma prática no mínimo questionável, temos um tratamento desigual entre Enfermeiros de diferentes instituições em idênticas condições.
2 - Enfermeiros que viram só entrar em vigor o Siadap em 2015, está-lhes a ser contado um ponto entre 2011 e 2014, e não o justo e correto ponto e meio. Isto porque até 31 de Dezembro de 2014 os Enfermeiros tiveram avaliação própria, devendo para aqui trazer o que plasma a alínea d) do nº2 do artigo 113 da lei 12-A de 2008:”d) Quando o sistema de avaliação do desempenho aplicado preveja duas menções ou níveis de avaliação, o número de pontos a atribuir é de um e meio para a menção ou nível correspondente a desempenho positivo e de um negativo para a menção ou nível correspondente a desempenho negativo”. Esclarecedor para a realidade da Enfermagem até 31 dezembro de 2014. E não só,até 2011 como algumas Instituições estão a fazer.
Estes são dois aspetos que urge resolver e aplicar corretamente aos enfermeiros para que se efetive um verdadeiro descongelamento de carreiras conforme inscrito no programa de Governo.
Caso contrário, teremos de assumir o compromisso do descongelamento de carreiras como um ato de prática nulidade.
E se estes são aspetos fundamentais para os Enfermeiros com contrato de trabalho para funções publicas, mais grave se tornam para os enfermeiros contratados individuais de trabalho em instituições públicas e/ou em instituições com parcerias Publico- Privadas.
Nestes dois casos não se visualizam quaisquer expectativas de desenvolvimento ou valorização profissional.
Também no setor privado, se assiste, na generalidade dos casos, a processos de negociação coletiva que apenas são aparências, ficando cada vez mais Enfermeiros ao livre arbítrio das instituições.
E que dizer da valorização da formação diferenciada dos Enfermeiros?
O País necessita de Enfermeiros com prática diferenciada em várias áreas, são as pessoas que necessitam. E o que vemos?
A estes Enfermeiros, o governo numa tentativa de silenciar o descontentamento, atribuiu um subsídio de 150 euros mensais.
O Pais que V.Exa. Preside diferencia o trabalho diferenciado (passe o pleonasmo) e especializado de um Enfermeiro nas suas 35 horas semanais com um acréscimo por hora de 1,07 Euros, é disto que falamos.
Está pré anunciada mais uma Greve da classe para dia 20 e 21 de Setembro, pretendo com esta carta sensibilizar V. Exa. para a necessidade de uma correta e justa negociação do nosso executivo com os representantes da profissão.
É elementar devolver justiça aos Enfermeiros, no País que V. Exa. Preside um Enfermeiro ao fim de 20 anos de serviço, a fazer Noites, Fins-de-semana, a trabalhar na Pascoa, no Natal, no Fim do Ano leva para casa 1000 euros de ordenado, e numa tentativa de compor o salário procura um duplo emprego fazendo valer a sua diferenciação, mas impedindo que um colega mais novo tenha um primeiro emprego. Mas o mais grave não são os 1000 euros Sr. Presidente, o mais grave é não se conseguir ver uma luz, não se vislumbrar caminho. Não Existir Futuro
É esta a triste realidade da Enfermagem vista através das minhas lentes, que acredito ser partilhada por alguns colegas.
Esta carta constitui um apelo a uma intervenção junto do executivo do NOSSO País.
Não pretendo substituir o trabalho empenhado das organizações Sócio Profissionais dos Enfermeiros, mas teremos de entender como uma enorme falta de respeito por uma Profissão os constantes adiamentos da tutela na negociação destas e de outras matérias que dizem respeito aos Enfermeiros.
O Sr. Presidente é garante do cumprimento da Constituição Portuguesa, apesar de não exercer funções executivas diretas, pode ter, e tem tido, um papel político ativo e conformador, em variadas situações da vida Pública Portuguesa.
O Sr. Presidente é um ser humano de emoções e afetos reconhecidamente, e neste momento o apelo direto é que tenha esse olhar emotivo e afetuoso com quem diariamente exerce Enfermagem nos variados contextos e independentemente do seu vínculo laboral.
Numa profissão que tem como símbolo a Lamparina, necessitamos de ter esperança, de manter a candeia acesa.
Deposito em si, o NOSSO Presidente a esperança para voltar a ter esperança.
O ser humano das emoções e dos afetos que possa servir de “combustível” para a nossa candeia.
A ENFERMAGEM precisa acima de tudo, de RESPEITO e FUTURO.
Acabo citando o Sr. Presidente numa visita a Beja em 2016 “…Fala-se de défice de tudo, de défice de orçamento, e não se fala do défice de esperança, que existiu durante uns anos em Portugal e é bom que esse défice seja vencido rapidamente….”
Antecipadamente grato, ao dispor de V. Exa para qualquer esclarecimento adicional, reservando-me o direito de divulgação desta carta.
Respeitosamente,
Rui Carlos Bastos dos Santos
C.Cidadão – 10027471
Enfermeiro
Rui Carlos Bastos Santos
Enfermeiro Serviço Urologia
CHULC, EPE - H. S. José- Lisboa
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