4 de julho
2016
Farmacêuticos vão monitorizar doentes
Lei inédita vai
consagrar o papel dos diferentes profissionais de saúde, ao fim de 20 anos a
tentar-se definir o «ato médico». Segue-se a procura de consenso em torno da
sustentabilidade do SNS.
Marta F. Reis
marta.reis@newsplex.pt
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Destaques
Farmacêuticos
a ajudar doentes a organizar a medicação e ouvir as suas queixas. Acontece
todos os dias nas farmácias mas só agora será reconhecido formalmente. O
governo e as sete ordens profissionais com intervenção nos cuidados de saúde
(médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, farmacêuticos, dentistas e
biólogos) estão a trabalhar num diploma que define, pela primeira vez e de
forma articulada, as competências dos diferentes profissionais. Ainda não há
consenso total, mas o reconhecimento do papel dos farmacêuticos na
«administração e monitorização de medicamentos» é uma das novidades na última
versão do diploma, a que o SOL acedeu.
Ana Paula Martins, bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, explicou ao SOL
que se nas farmácias hospitalares este trabalho já é reconhecido, nas farmácias
comunitárias a primeira grande concretização será o protocolo para dispensa de
antirretrovirais. Até aqui os seropositivos levantam a medicação nos hospitais
e poderão passar a fazê-lo nas farmácias se assim o entenderem, num acordo
entre o governo e a Associação Nacional dos Farmácias que aguarda luz verde das
Finanças. Ana Paula Martins adianta que fica aberto caminho para outros
protocolos: «Há um reconhecimento da relação de proximidade entre farmacêutico
e doente e uma maior articulação com os médicos assistentes. Atualmente existe
essa relação mas a articulação com os médicos nem sempre é imediata».
A criação deste diploma tem passado despercebida mas as reuniões que sentam
à mesma mesa os sete bastonários começaram em Março. Nos últimos 20 anos houve
várias tentativas para legislar o «ato médico», algo que a Lei de Bases da
Saúde prevê desde 1990. Em 1998, chegou a haver reuniões entre ordens e o
parlamento aprovou, em 1999, um diploma que estabelecia o ato médico, dizendo
que só tinham competência para tal licenciados em medicina inscritos na Ordem -
na altura um diploma polémico por surgir no seio da luta dos médicos contra as
terapias alternativas.
Nos trabalhos preliminares, o diploma reconhecia que outros profissionais
de saúde legalmente habilitados podiam praticar ações técnicas integradas no
conceito de ato médico mas a versão final deixou cair esse artigo. Jorge
Sampaio acabou, porém, por vetar o diploma, invocando ausência de debate. No
ano seguinte, o PSD apresentou um novo diploma que regulava apenas as
competências médicas, considerando que não estava em causa definir o ato
terapêutico nem outras intervenções autónomas. Este projeto também não avançou.
Desta feita, a iniciativa do governo foi criar uma legislação transversal,
para valorizar a interação e o trabalho em equipa, bem como os conhecimentos e
competências de cada profissão. Da lei do ato médico passou a falar-se de uma
«lei do ato em saúde», num processo que, ao que o SOL apurou, tem sido
acompanhado de perto por Marcelo Rebelo de Sousa, que já mais do que uma vez
saudou os consensos na saúde e apelou a mais convergências.
Enfermeiros insatisfeitos
As maiores reservas foram tornadas públicas na última semana pela Ordem dos
Enfermeiros. Uma segunda versão do documento, discutida esta semana numa
reunião entre as diferentes ordens, surgia excluída algumas competências de
enfermagem (como o diagnóstico e prescrição de atos de enfermagem). Os
enfermeiros viram reconhecidas apenas as funções de avaliação e execução de
terapêuticas, quando às restantes ordens são reconhecidas competências de
intervenção.
Outro ponto de discórdia é o facto de outras profissões verem reconhecidas
competências que vedam a ação dos enfermeiros, como administrar também
medicamentos (por exemplo vacinas) ou dar conselhos nutricionais. Na descrição
do ato de enfermagem surge ainda a legis artis, termo médico que a bastonária
Ana Rita Cavaco considera ser uma provocação. Perante a contestação, o governo
pediu novos contributos até à próxima semana.
Ontem, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses juntou-se ao protesto da
Ordem e considerou que a versão atual do diploma é um «retrocesso de 50 anos no
reconhecimento das competências dos enfermeiros». O SEP inclui a revisão do
documento nas reivindicações que levam à convocação de uma greve para o final
do mês. A bastonária Ana Rita Cavaco adiantou, contudo, ao SOL ter a garantia
da tutela de que o diploma só será fechado com acordo de todos.
Nesta procura de consensos inédita, há um documento mais amplo na forja. As
ordens foram convidadas pelo governo para construir e assinar um ‘Compromisso
para a Sustentabilidade do SNS’ - documento já mais próximo do pacto para a
Saúde a que Marcelo tem apelado mas ainda sem passar por uma concertação entre
partidos, os destinatários finais dos reptos do presidente.
Os principais eixos deste compromisso, a que o SOL teve acesso, incluem a
ideia de multidisciplinaridade e passam pela promoção da saúde, redução das
desigualdades, reforçar o poder do cidadão no SNS, expandir a rede de cuidados
ou melhorar a gestão dos hospitais e de recursos humanos. No final, serão
traduzidos em medidas concretas.
Por esta altura, os trabalhos estão mais demorados, até porque as medidas
esboçadas não têm ainda indicadores precisos, o que alguns bastonários
consideram essencial para assinarem o documento. «Mais do que uma data para
encerrar qualquer um destes dois documentos, estamos interessados em que sejam
documentos em que todos se revejam e constituam marcos em saúde para o futuro»,
disse fonte do ministério. [.....fonte de onde brota água abundante para sustentar a sustentabilidade da coisa, digo eu, José Azevedo]
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