Carlos Cortes acusa tutela de «desleixar» SNS
«Parece que estamos na “Idade do Gelo”, quando se trata de dialogar com as organizações médicas! Pouca coisa muda, tudo se mantém muito estático», declarou Carlos Cortes ao «Tempo Medicina», no âmbito do debate realizado na noite de 2 de Julho, na sede da SRCOM, em Coimbra.
A reunião, no formato de debate, que a Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM) organizou, quarta-feira à noite, no contexto do ciclo «Conversa em dia», cujo tema foi «A actual crise na Saúde – acções a desenvolver», foi consensual entre as várias organizações e os médicos que nela participaram. Ou seja, foi transversal o sentimento de que «a situação que atravessamos na Saúde é muito delicada» e de que «existe uma agenda política notória no enfraquecimento do Serviço Nacional de Saúde [SNS]».
Na perspectiva do presidente do Conselho Regional do Centro da Ordem dos Médicos (CRCOM), «os profissionais de saúde são o alvo preferencial das más decisões do Ministério da Saúde [MS] porque são, precisamente, estes que mais têm manifestado a sua preocupação e que mais têm lutado para a preservação de uma Saúde de qualidade».
No encontro, em que também intervieram Luís Filipe Silva (do SIM – Sindicato Independente dos Médicos) e Sérgio Esperança (do SMZC – Sindicato dos Médicos da Zona Centro, afecto à Federação Nacional dos Médicos), «falou-se muito em desmotivação dos profissionais, da desconsideração do seu papel nos hospitais e nos centros de saúde e até de perseguições, quando expressam posições diferentes das directrizes hierárquicas», disse Carlos Cortes ao «Tempo Medicina» («TM»). «Independentemente da forma, todos concordaram que é urgente desencadear processos para exigir do MS um retrocesso num caminho que está a levar o País a perder uma das maiores conquistas sociais das últimas décadas: o SNS», observou o responsável regional da Ordem dos Médicos (OM).
Os problemas «múltiplos» e a «boa vontade»
Criticando a «falta de exigência no caminho» traçado pelo MS, sobretudo no que respeita à «qualidade da Saúde», o presidente do CRCOM afirmou ao «TM» que os problemas encontrados neste sector social «são múltiplos, alguns deles com meses ou anos». «Estamos a ter uma acção directa junto dos decisores regionais e locais, com a Administração Regional de Saúde do Centro [ARSC], com os conselhos de administração dos hospitais e ACeS [agrupamentos de centros de saúde] e com os próprios directores clínicos e directores de serviços», referiu.
«O primeiro passo da SRCOM é colocar-se como um parceiro e colaborador responsável para resolver problemas, muitas vezes de fácil resolução e que só dependem da boa vontade dos intervenientes», sublinhou Carlos Cortes, adiantando: «Em casos mais complexos e quando não existe boa vontade, os problemas têm sido denunciados publicamente e expostos claramente para obrigar os responsáveis a tomarem atitudes correctas. A Ordem dos Médicos tem, assim, contribuído para a resolução de muitas situações que se arrastavam e que constituíam falhas na prestação dos cuidados de saúde e na formação dos médicos.»
«Mas também estamos a fazer um trabalho de fundo importante, que irá ter efeitos práticos nos próximos meses», sublinhou o presidente do CRCOM, aludindo a «um levantamento exaustivo de todos os problemas das unidades de saúde da região Centro, a começar pela formação médica». Essa constituirá, segundo Carlos Cortes, «uma análise responsável que deverá servir para comprovar que a SRCOM tem razão nas denúncias que tem feito e para obrigar o Ministério da Saúde a rever a sua postura de desleixo do SNS e desprezo pelos profissionais de saúde».
Reivindicações e propostas «colocadas no congelador»
Um dos assuntos debatidos na sessão do ciclo «Conversa em dia», na SRCOM, prendeu-se com o ponto da situação na sequência do recente «caderno de exigências» que a OM e os sindicatos médicos entregaram à equipa ministerial de Paulo Macedo. A esse respeito, Carlos Cortes notou ao «TM» que «o memorando de exigências e de propostas não tem tido efeitos práticos substanciais que possam reflectir uma mudança de estratégia do MS. As reivindicações e as propostas construtivas da Ordem dos Médicos foram colocadas no congelador do Ministério».
«A inanição e a apatia do Ministério perante os desafios que a Ordem dos Médicos tem colocado são preocupantes e revelam um profundo desrespeito por uma classe profissional que tem um papel central na manutenção dos actuais níveis de qualidade na prestação de cuidados de saúde», denuncia o dirigente regional do Centro da OM.
Dando conta de que «quem hoje está a contribuir para a sustentabilidade do SNS são, sobretudo, os médicos e os profissionais do sector», Carlos Cortes sublinhou que «a avaliação feita [no debate de quarta-feira à noite, em Coimbra] é consensual entre as várias organizações». No entanto, «a Ordem dos Médicos tem medidas próprias que está a desenvolver, já que tem uma área de intervenção específica e diferente da intervenção sindical», a exemplo das «denúncias públicas das graves deficiências que ocorrem nos hospitais e centros de saúde», podendo «vir a pôr em prática a retirada dos médicos que nomeou para as várias comissões e grupos de trabalho».
«Ministério deveria fazer uma introspecção profunda»
«Os sindicatos médicos têm um âmbito de acção diferente e outros instrumentos de intervenção que utilizam com toda a legitimidade e autonomia», frisou Carlos Cortes, esclarecendo que «a Ordem dos Médicos apoiará todas as iniciativas que visem melhorar a qualidade de saúde e a dignidade dos médicos». Nessa conformidade, o presidente do CRCOM aludiu à concentração «Pela nossa Saúde e em defesa do SNS» marcada para 8 de Julho, em frente do Ministério (na Avenida João Crisóstomo), na expectativa de que ali «estarão presentes médicos, estudantes de Medicina e a população em geral, já que várias associações de doentes manifestaram o seu apoio à greve anunciada».
Ao reforçar o apoio à greve também manifestado pela OM –- através do comunicado do seu Conselho Nacional Executivo (CNE), em 1 de Julho -–, reconhecendo «a gravidade do momento actual no sector da Saúde», Carlos Cortes expressou ao «TM» que «a greve [nos dias 8 e 9 de Julho] e a concentração em Lisboa são um forte sinal de alarme para o Ministério, o qual deveria fazer uma introspecção profunda sobre as decisões que tem vindo a tomar».
TM 02.07.14
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