sexta-feira, 22 de agosto de 2014

QUANTO GANHAM OS MÉDICOS NO SNS DOS 85% DO TOTAL QUE ABSORVEM?

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Quanto ganham os médicos no SNS?
Revelação do contrato com Cuba gerou comparação de salários. Comparar é difícil, mais eis alguns exemplos de vencimentos de médicos
Quanto ganha um médico de família? E os 4230 euros/mês que o Estado paga pelos cubanos é mais ou menos? A tutela explicou esta semana que, em início de carreira, os valores são inferiores. E que a decisão de recrutar clínicos em Cuba tem como motivo a falta de profissionais no país. À medida que progridem na carreira e, tendo em conta o que o Estado empregador paga além do salário, encargos da Segurança Social e ADSE, os portugueses podem custar mais, revelou a tutela. Já quando são contratados a empresas de serviços, os valores são idênticos aos vencimentos dos médicos de Cuba. A Ordem contestou a comparação porque os cubanos não têm especialidade. O bastonário diz ainda ser preciso pesar os encargos que as autarquias têm com casa, água e luz, condições que não são oferecidas para colocar os clínicos nas regiões do Interior.
Entre a troca de argumentos, o exercício de comparação revela-se difícil. As tabelas salariais são matéria complexa: há categorias, escalões, suplementos que se aplicam nuns e não noutros e contratos de exclusividade do passado. Vários médicos forneceram folhas de vencimento ao e são peremptórios em rejeitar salários elevados. Mostram também que não é só em início de carreira que ganham menos. J., médico de família, trabalha há 33 anos no SNS e recebe brutos 2241 euros. Os médicos dizem que a progressão para os patamares mais altos das tabelas salariais há muito que não ocorre e os internos queixam-se de diferenças regionais na sua promoção entre os quatro escalões previstos. Em alguns casos, os médicos admitem que as condições do acordo com Cuba, em valor ou alojamento, fariam a diferença e até os fariam trabalhar em exclusividade no SNS. Mas a queixa mais comum é de que existe uma ideia pública de que os médicos têm salários milionários, o que dizem não ser a realidade da maioria.
10 Casos
Especialista em dermatologia desde 1999 
Valor bruto  2008€/ V alor líquido  1319€
Paulo Varela tem 47 anos. Começou a trabalhar no SNS em 1992 e é especialista em dermatologia desde 1999. Tem um contrato por tempo indeterminado como assistente hospitalar graduado de dermatologia no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia e Espinho. Trabalha em regime de 35 horas sem dedicação exclusiva, com redução de horário e salário a 80% por aplicação de um decreto de 1999. Exerce também no privado.
 
Neurorradiologista com contrato individual
Valor bruto  2440€/Valor líquido  1556€
M. tem 36 anos, trabalha no SNS há 12 anos, os últimos cinco já como especialista em neurorradiologia. Tem um contrato individual de trabalho para 35 horas semanaisl num hospital da zona Centro, que não obedece a escalões de vencimento e não oferece possibilidade de progredir na carreira, explica. O contrato individual de trabalho não permite regime de exclusividade, pelo que pode trabalhar em clinica privada, o que faz esporadicamente. Na folha de vencimento que enviou ao i, 107,23 euros correspondem a quatro urgências nocturnas de 12 horas, do período das 20 horas às 8 horas do dia seguinte. Dá 2,2 euros por hora. 
 
Director de serviço,  no SNS há 37 anos 
Valor bruto  1686€/Valor líquido  1182€
Davide Carvalho tem 61 anos e trabalha no SNS há 37 anos. É director do Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do Hospital de S. João desde 2010. Licenciou-se em Medicina em 1976 e é médico especialista há 28 anos. Tem um contrato de 35 horas no SNS em acumulação com o trabalho de professor regente na Faculdade de Medicina do Porto, o que abate 2000 euros no salário de médico, valor pago pela universidade. Trabalha no sector público das 8h às 14h e duas tardes das 15h30 às 20h. Trabalha no privado três vezes por  semana, das 15h30 às 20h.
 
Último ano de internato de medicina familiar 
Valor bruto  1835€/ V alor líquido  1345€
Marcos Agostinho tem 41 anos e trabalha 40 horas por semana na USF D. Jordão, na Lourinhã. Está no quarto e último ano do internato de Medicina Geral e Familiar, sem perspectivas que o salário melhore quando concluir a especialidade. Por lei, já devia ter subido de escalão da tabela de interno, mas o pedido na Administração Regional de Lisboa ainda não foi aceite. Significaria mais 100 euros por mês, diz. Estes são os valores do vencimento de Agosto. Normalmente recebe 1400 euros mensais líquidos mas este mês foram descontados os dois dias de greve dos médicos, a 8 e 9 de Julho. Trabalha só para o SNS, porque não tem tempo e oportunidade para exercer no privado e também por razões familiares. 
 
Ortopedista chega  às 64 horas por semana 
Valor bruto  3868€/ V alor líquido  2239€
Carlos Maia Dias é médico ortopedista desde 2012 e chefe de uma das equipas de urgência de Ortopedia no Hospital de Santarém. Tem como salário bruto 2756 euros para 40 horas de trabalho semanal onde estão incluídas 18 horas na urgência. Mas todas as semanas faz mais seis horas extra, 24 por mês. Aumenta o vencimento mas abdicava delas: passa cinco noites por mês no hospital e faz mais horas para assegurar as escalas, por falta de pessoal. Trabalha também no privado, onde diz ser melhor  remunerado e onde vê doentes que pagam menos por consulta que de taxa moderadora.
 
Médica e doutoranda nos tempos livres 
Valor bruto  2707€/ valor líquido  1902€
M. é médica especialista em Genética Médica e tem contrato individual de trabalho sem termo como assistente num hospital da zona de Lisboa desde Abril de 2012. Admite ter tido sorte, porque muitos colegas ainda não entraram na carreira. Mas a satisfação termina por aí: não trabalha 40 mas 80 horas, porque nos “tempos livres” está a fazer o doutoramento e tem duas filhas pequenas e um marido bolseiro, com vencimento de 980 euros/mês, pelo que não pode suspender o trabalho para continuar a formação. Lamenta que a actividade científica não seja valorizada na profissão médica em Portugal, quando em países como Inglaterra chega a representar 40% do horário dos profissionais. 
 
Médica de família há quase quatro anos 
Valor bruto  1996€/ V alor líquido 1282€
Ângela Neves, de 34 anos, fez o internato em Medicina Geral e Familiar nos Hospitais da Universidade de Coimbra e em Outubro de 2010 foi colocada como médica de família no centro de saúde de Castanheira de Pera, a 65 km de casa. Onze meses depois pediu para ir para a Unidade de Saúde Familiar de Arazede, onde hoje trabalha e onde já tinha estado no internato. Tem um contrato de trabalho de 35 horas e em Novembro pediu a passagem para dedicação exclusiva com 42 horas, que não foi autorizada por já não ser uma hipótese. Pediu entretanto a passagem ao regime de 40 horas, negociada em 2012 com os sindicatos para garantir maior cobertura de utentes e aumento de vencimento, estando a aguardar resposta.  
 
Médico de família  há 33 anos no SNS   
Valor bruto  2241€/ V alor líquido  1690€
Aos 59 anos e com 33 anos de carreira no SNS, o vencimento de J. varia todos os meses e no recibo são tantas as alíneas que nem as consegue decifrar. De salário base pelas 35 horas semanais num centro de saúde do Norte recebe 2 240,19, a que acresce um complemento de clínica geral calculado em função do concelho onde está colocado e utentes, de 92 euros. Com os descontos para a CGA, ADSE e IRS recebe ao final do mês valores que variam mensalmente entre os 1500 e os 1900 euros. Não se importava de trabalhar 44 horas por semana tendo o mesmo salário bruto que o governo paga pelos médicos cubanos e em exclusividade . De momento, diz não ter alternativa senão fazer também privado. 
 
Internas de psiquiatria com horas extra 
Valor bruto  2109€/ V alor líquido  1356€
Ana Dias Amaral tem 26 anos e trabalha no SNS desde Janeiro de 2013. Está no primeiro escalão do internato médico, a especializar-se em psiquiatria no Centro Hospitalar de São João, Porto. Trabalha 40 horas em exclusividade mas, no último vencimento, ao salário bruto base de 1835,41 acrescem 12 horas de urgência diurna feita num domingo dois meses antes, pagas por 31,77 euros, 2,65 euros/hora. Na mesma situação está Filipa Moutinho, interna da mesma especialidade noutro centro hospitalar e com o mesmo salário base. Em Maio fez mais 42 horas suplementares, pagas no conjunto a 2,34 euros cada. 
 
Médico de família no interior 
Valor bruto  2134€/Valor líquido  1345€
Tiago Santos é de Vila Nova de Gaia e terminou a especialidade em Medicina Geral e Familiar em 2010. Está no interior, na USF Almonda, em Torres Novas, onde trabalhou um contingente de médicos porto-riquenhos, que no período inicial tinham direito a transporte e alojamento, o que os colegas nacionais mesmo deslocados não têm. Mantém um horário de 35 horas, apesar de em Janeiro de 2013 ter pedido a passagem para as 40 horas. Apesar de ver 90% dos utentes apontados como limite máximo para estar neste regime, o seu pedido não tem sido aprovado e sente que os serviços o encaram como limite mínimo. Não tem exclusividade e duas vezes por mês faz horas num lar, ganhando por isso 60 a 100 euros mensais.

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