JORNADA CONTÍNUA
(Apontamento Jurídico)
Ref.ª: Circular Normativa n.º 4, de 2013.11.11, da
ARS Norte
Assunto: Organização do Tempo de Trabalho dos
Enfermeiros
Face à Circular Normativa, em
referência, cumpre-nos tecer as seguintes considerações:
"A)
Quanto ao período normal de trabalho"
1.
É verdade que " O n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, estabelece que
o período normal de trabalho dos
trabalhadores em funções públicas é de 8 horas por dia e 40 horas por
semana".
2.
Mas, também, é verdade que a mesma Lei não se
confina a este preceito legal, pois tem
12 artigos, dos quais destacamos, por pertinentes: Artigo 1.º - Objecto;
Artigo 2.º - Período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas;
Artigo 3.º - Alteração ao Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas;
Artigo 4.º - Alteração ao Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de agosto; Artigo 9.º -
Alteração à Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro; 10.º - Prevalência; e Artigo
12.º - Entrada em vigor e produção de efeitos. Isto é,
3.
Temos de ler todos os artigos da referida Lei
68/2013, para sabermos o que ela diz, no seu conjunto, e para deduzirmos o que
o legislador quis dizer. Assim,
4.
No art. 1.º, sobre o objecto da Lei, diz que "...A presente lei estabelece a duração
do período normal de trabalho em funções públicas, alterando em conformidade:..." (negrito nosso).
5.
E, em conformidade, altera: o Regime do
Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado em anexo à Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro; o Decreto-Lei
n.º 259/98, de 18 de agosto, mantendo o
seu art. 38.º; ... e a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, mantendo o seu art. 5.º. , em qualquer
caso, o reconhecimento da vigência destes diplomas legais. Portanto,
6.
Em conformidade com o objecto da Lei, mantêm-se
em vigor o art. 38.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de agosto e o art. 5.º da
Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro.
7. O
primeiro diz; "Mantêm-se em vigor os regimes de trabalho e condições da sua
prestação fixados em legislação especial para o pessoal docente e da
saúde e, bem assim, para o sector
da justiça, sem prejuízo do
previsto no artigo 15.º." (negrito e sublinhados nossos).
8.
O segundo diz: "O regime de duração e
organização do tempo de trabalho aplicável ao pessoal das carreiras de saúde é
o estabelecido nos respectivos diplomas legais.".
9.
Ambos os referidos preceitos legais subtraem a carreira especial
de enfermagem do regime das 40 horas por semana e 8 horas por dia, se presumirmos
que o legislador disse o que quis e quis o que disse.
10. Portanto,
a invocação do n.º 1 do artigo 2.º da Lei
n.º 68/2013, de 29 de agosto, com as
consequências que, na referida Circular
Normativa n.º 4, de 2013.11.11, da ARS Norte, daí decorrem não são tão
lineares como pretende, diremos, mesmo, que entendemos que tal preceito legal
não é aplicável à Carreira Especial de Enfermagem, cujo estatuto, adiante,
desenvolveremos, segundo o nosso entendimento.
11. Prosseguindo
na apreciação à Circular Normativa., diremos que o que aí, no seu n.º2, se diz
("Por força do artigo 28.º do
Decreto-lei n.º 248/2009, de 22 de setembro, o regime de duração e organização
do tempo de trabalho dos enfermeiros da carreira especial de enfermagem, é
ainda o previsto no Capitulo VI do Decreto-lei n.º 437/91, de 8 de
novembro".), corresponde ao nosso entendimento sobre a questão.
12. Mas
não é esse o sentimento que perpassa pelos restantes pontos da Circular, que
abraçam o "regime das 40 horas". E até sobe às 45 horas, por agora.
13. Pelo
que já se disse acima, é, em absoluto,
ilegal o período de intervalo para almoço - B),
n.º 8. - como, também é ilegal a
organização do tempo de trabalho - C), n.ºs 9 a 12. - como decorre do art. 5.º da Lei n.º 59/2008,
de 11 de setembro e do art. 56.º do Dec.-Lei n.º 437/91, de 08/11
14. O art. 56.º, n.º 6, do DL 437/91, constitui
disposição especial em matéria de modalidades de horários, i.é., e só, trabalho por turnos e/ou jornada
contínua.
15. É
evidente o desconhecimento do estatuto da Carreira Especial de Enfermagem.
16. Por
outro lado, nos termos
do n.º 1 do art. 5.º da Lei n.º 23/98, de 26/05, “É garantido aos trabalhadores da Administração Pública em regime de
direito público o direito de negociação colectiva do seu estatuto”.
17. “São
objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração: …
f) Da duração e horário de trabalho…”
(art. 6.º do mesmo diploma legal).
18. Ao
afirmar que o direito à contratação colectiva “é garantido nos termos da lei”,
o art. 56.º, n.º 3, da CRP, impôs uma tutela especial do direito de contratação
colectiva, bem como a necessidade da existência de disciplina legal para que
esse direito não seja posto em causa.
19. O
próprio Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 966/96, de 11/07/96 - Proc.
22/93, reportando-se ao artigo 56.º da CRP, refere: “…uma vez que este artigo se encontra inserido no Título II da Parte I
da Constituição, não subsistem hoje dúvidas quanto à qualificação do direito de
contratação colectiva como um direito fundamental. Trata-se, na verdade, de um
direito dos trabalhadores (Capítulo III) a que é imediatamente aplicável o
regime dos direitos, liberdades e garantias, ex vi do art. 17.º da
Constituição…”.
20. Isto
é, para dar cumprimento a este normativo legal, em matéria da duração e horário
de trabalho dos enfermeiros, dada a ausência de convenção colectiva de
trabalho, impõe-se a sua negociação com os sindicatos.
Porto, 14 de novembro de 2013
O
Jurista
(A. Correia Azevedo)
NB: Dizem os bem informados que é o gabinete do próprio Ministro da Saúde, que está a dar ordens subreptícias, às instituições para fraturarem a jornada contínua, aos Enfermeiros dos CSP. E os nomeados presidentes, lá mandam os seus juristas farzer figura de sábios inventores e os pobres coitados só produzem asneiras de cariz asinário, como este exemplar, que o nosso jurista desmonta, demonstrando como está a violar a lei.
Há dias, ao serão, ouvimos o Sr. Ministro, em Braga, orgulhar-se com a redução de despesa do seu Ministério, à custa do desprezo pelos direitos mais elementares dos Enfermeiros, que está a cultivar, mantendo uma estrutura orgânica, que já não se usa, em parte alguma do mundo, mas que insiste em manter: a médicomania, ou medicofilia que custam ao orçamento do Ministério da Saúde 85% da massa salarial total, só para manter o figurino médico, totalmente ultrapassado, aliás, que não realiza 85% das tarefas; longe, muito longe disso.
Os magros 15% sobrantes, são as sobras para pagar a Enfermeiros e a todos os outros funcionários.
Enquanto esta aberração se mantiver, não podemos acreditar na maior parte do que vem a público, do lado do MS.
Quem puder e quiser, que acredite.
Nós, mesmo que quisessemos acreditar, não podemos, porque não encontramos nenhuma explicação lógico-formal, coerente, razoável, para tanta e tal diferença.
Eis um exemplo perfeito e objectivo do abuso do poder.
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