quinta-feira, 13 de março de 2014

ACTUALIZANDO A LEITURA - JORNADA CONTÍNUA É...

JORNADA CONTÍNUA

(Apontamento Jurídico)


Ref.ª: Circular Normativa n.º 4, de 2013.11.11, da ARS Norte

Assunto: Organização do Tempo de Trabalho dos Enfermeiros


Face à Circular Normativa, em referência, cumpre-nos tecer as seguintes considerações:


"A) Quanto ao período normal de trabalho"

1.     É verdade que " O n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, estabelece que o  período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas é de 8 horas por dia e 40 horas por semana".

2.     Mas, também, é verdade que a mesma Lei não se confina a este preceito legal, pois tem  12 artigos, dos quais destacamos, por pertinentes: Artigo 1.º - Objecto; Artigo 2.º - Período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas; Artigo 3.º - Alteração ao Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas; Artigo 4.º - Alteração ao Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de agosto; Artigo 9.º - Alteração à Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro; 10.º - Prevalência; e Artigo 12.º - Entrada em vigor e produção de efeitos. Isto é,

3.     Temos de ler todos os artigos da referida Lei 68/2013, para sabermos o que ela diz, no seu conjunto, e para deduzirmos o que o legislador quis dizer. Assim,

4.     No art. 1.º, sobre o objecto da Lei, diz que "...A presente lei estabelece a duração do período normal de trabalho em funções públicas, alterando em conformidade:..." (negrito nosso).

5.     E, em conformidade, altera: o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado em anexo à Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro; o Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de agosto, mantendo o seu art. 38.º; ... e a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, mantendo o seu art. 5.º. , em qualquer caso, o reconhecimento da vigência destes diplomas legais. Portanto,

6.     Em conformidade com o objecto da Lei, mantêm-se em vigor o art. 38.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de agosto e o art. 5.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro.

7.     O primeiro diz; "Mantêm-se em vigor os regimes de trabalho e condições da sua prestação fixados em legislação especial para o pessoal docente e da saúde e, bem assim, para o sector da justiça, sem prejuízo do previsto no artigo 15.º." (negrito e sublinhados nossos).

8.     O segundo diz: "O regime de duração e organização do tempo de trabalho aplicável ao pessoal das carreiras de saúde é o estabelecido nos respectivos diplomas legais.".

9.     Ambos os referidos  preceitos legais subtraem a carreira especial de enfermagem do regime das 40 horas por semana e 8 horas por dia, se presumirmos que o legislador disse o que quis e quis o que disse.

10.  Portanto, a invocação do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, com as consequências que, na referida Circular Normativa n.º 4, de 2013.11.11, da ARS Norte, daí decorrem não são tão lineares como pretende, diremos, mesmo, que entendemos que tal preceito legal não é aplicável à Carreira Especial de Enfermagem, cujo estatuto, adiante, desenvolveremos, segundo o nosso entendimento.

11.  Prosseguindo na apreciação à Circular Normativa., diremos que o que aí, no seu n.º2, se diz ("Por força do artigo 28.º do Decreto-lei n.º 248/2009, de 22 de setembro, o regime de duração e organização do tempo de trabalho dos enfermeiros da carreira especial de enfermagem, é ainda o previsto no Capitulo VI do Decreto-lei n.º 437/91, de 8 de novembro".), corresponde ao nosso entendimento sobre a questão.

12.  Mas não é esse o sentimento que perpassa pelos restantes pontos da Circular, que abraçam o "regime das 40 horas". E até sobe às 45 horas, por agora.

13.  Pelo que já se disse acima, é, em absoluto, ilegal o período de intervalo para almoço  -  B), n.º 8. - como, também é ilegal a organização do tempo de trabalho - C), n.ºs 9 a 12.  - como decorre do art. 5.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro e do art. 56.º do Dec.-Lei n.º 437/91, de 08/11

14.  O art. 56.º, n.º 6, do DL 437/91, constitui disposição especial em matéria de modalidades de horários, i.é., e só, trabalho por turnos e/ou jornada contínua.

15.  É evidente o desconhecimento do estatuto da Carreira Especial de Enfermagem.

16.  Por outro lado, nos termos do n.º 1 do art. 5.º da Lei n.º 23/98, de 26/05, “É garantido aos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público o direito de negociação colectiva do seu estatuto”.

17.   “São objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou alteração: … f) Da duração e horário de trabalho…” (art. 6.º do mesmo diploma legal).

18.  Ao afirmar que o direito à contratação colectiva “é garantido nos termos da lei”, o art. 56.º, n.º 3, da CRP, impôs uma tutela especial do direito de contratação colectiva, bem como a necessidade da existência de disciplina legal para que esse direito não seja posto em causa.

19.  O próprio Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 966/96, de 11/07/96 - Proc. 22/93, reportando-se ao artigo 56.º da CRP, refere: “…uma vez que este artigo se encontra inserido no Título II da Parte I da Constituição, não subsistem hoje dúvidas quanto à qualificação do direito de contratação colectiva como um direito fundamental. Trata-se, na verdade, de um direito dos trabalhadores (Capítulo III) a que é imediatamente aplicável o regime dos direitos, liberdades e garantias, ex vi do art. 17.º da Constituição…”.

20.  Isto é, para dar cumprimento a este normativo legal, em matéria da duração e horário de trabalho dos enfermeiros, dada a ausência de convenção colectiva de trabalho, impõe-se a sua negociação com os sindicatos.


Porto, 14 de novembro de 2013

O Jurista
(A. Correia Azevedo)


NB: Dizem os bem informados que é o gabinete do próprio Ministro da Saúde, que está a dar ordens sub-reptícias, às instituições para fracturarem a jornada contínua, aos Enfermeiros dos CSP. E os nomeados presidentes, lá mandam os seus juristas fazer figura de sábios inventores e os pobres coitados só produzem asneiras de cariz asinário, como este exemplar, que o nosso jurista desmonta, demonstrando como está a violar a lei.
Há dias, ao serão, ouvimos o Sr. Ministro, em Braga, orgulhar-se com a redução de despesa do seu Ministério, à custa do desprezo pelos direitos mais elementares dos Enfermeiros, que está a cultivar, mantendo uma estrutura orgânica, que já não se usa, em parte alguma do mundo, mas que insiste em manter: a médicomania, ou medicofilia que custam ao orçamento do Ministério da Saúde 85% da massa salarial total, só para manter o figurino médico, totalmente ultrapassado, aliás, que não realiza 85% das tarefas; longe, muito longe disso.
Os magros 15% sobrantes, são as sobras para pagar a Enfermeiros e a todos os outros funcionários. 
Enquanto esta aberração se mantiver, não podemos acreditar na maior parte do que vem a público, do lado do MS.
Quem puder e quiser, que acredite.
Nós, mesmo que quisessemos acreditar, não podemos, porque não encontramos nenhuma explicação lógico-formal, coerente, razoável, para tanta e tal diferença.
Eis um exemplo perfeito e objectivo do abuso do poder.

Com amizade,

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