domingo, 29 de dezembro de 2013

A DEFORMA DO ESTADO

[Reforma de Estado
A questão dos incentivos ao desempenho na administração pública, nomeadamente na da Saúde, é um daqueles temas malditos, com escassos intervalos de lucidez governativa.


Começo por avisar que vou tratar de um tema onde tenho interesse pessoal, por ter sido o ministro da saúde responsável pela sua criação: as unidades de saúde familiares (USF). Muito do que escrever será sempre afectado pelo enorme interesse cívico que tenho no sucesso dessa reforma.
São duas as razões que me levam a passar a barreira da reserva: o tratar-se de uma essencial e unanimemente aplaudida reforma dos cuidados de saúde primários, com provas registadas e riscos anunciados de que ela possa desaparecer. Nesta mesma página, Francisco Ramos, que acompanhou a reforma como secretário de estado no tempo em que fui ministro, explica de forma clara o que trouxeram as USF. Basta consultar alguns Portugueses que as frequentem regularmente e comparar a evolução de gastos associados à consulta. Digamos ainda, por ser verdade, que as USF só foram possíveis por terem sido preparadas, desenhadas, administradas e animadas por médicos e enfermeiros que, com sacrifício da sua comodidade, estiveram dispostos a alterar o ineficaz e ineficiente modelo dos centros de saúde convencionais em unidades onde o doente tivesse sempre consulta marcada, sem ter que ir às seis da manhã buscar a senha para um contacto que podia ocorrer apenas às doze, ou nem sequer ocorrer. Que pudesse falar ao telefone com seu médico e que caso ele estivesse ausente, em serviço ou formação, pudesse ser visto com todo o seu processo clínico por um colega. Um dos elementos essenciais desta revolução seria o pagamento em duas componentes, uma de base, que servisse para garantir os direitos dos profissionais à pensão correspondente à sua categoria profissional e outra, proporcional ao desempenho. Naturalmente, incentivos paralelos (não equivalentes) foram criados para enfermeiros e secretários clínicos, sem cujo contributo o sistema não pode funcionar. Certamente as despesas directas com pessoal aumentaram, mas foram compensadas pela redução de horas extra, encerramento de serviços de atendimento permanente e urgências nocturnas, pela redução dos encargos em medicamentos e meios de diagnósticos e sobretudo pela poupança de tempo do doente, simplificação do processo, qualidade do atendimento e pela visível satisfação para doentes e profissionais que consideram as USF como coisa sua.
Apesar de recente, o modelo foi adoptado pela Troika, merecendo referência expressa no primeiro memorando de entendimento como medida a prosseguir e a generalizar. O reconhecimento internacional tem sido unânime, de países tão diversos como Argentina e Canadá.( o nosso herói anda a ler pouco e tem a bússola avariada). A criação de novas USF tem crescido a ritmo lento, sobretudo nos últimos anos, das 106 que existiam em Janeiro de 2008 quando cessei funções, a um pouco menos de 400 que agora existem. Várias explicações concorrem: fadiga do entusiasmo após a “first move advantage”, passagem à reforma de muitos médicos e enfermeiros de família, ausência de ânimo dos serviços e seus sucessivos dirigentes, restrições financeiras mesmo para as pequenas obras e equipamentos necessários, contaminação pelo ambiente depressivo geral do País e concentração da mensagem política do Governo, em geral, na teoria do abuso e castigo.
A questão dos incentivos ao desempenho na administração pública, nomeadamente na da Saúde, é um daqueles temas malditos, com escassos intervalos de lucidez governativa. Paulo Mendo e Leonor Beleza, cada um a seu tempo e de modos diferentes, tentaram criar sistemas de incentivos. Mendo, como confirmador da carreira de medicina familiar (após a sua criação frustrada pelo Governo Pintasilgo) e forte contribuinte dos centros de saúde de segunda geração, tentou denodadamente junto do ministério das finanças substituir ou complementar o pagamento por ordenado por retribuição por desempenho. Sem sucesso. Conhecendo eu a mentalidade prevalente naquele ministério, onde o pavor do incerto vence sempre a eficiência da inovação, tinha obrigação de não me deixar derrotar. Poupo nos pormenores, apenas para referir que me joguei todo no prato da balança. Convenci o governo e as finanças, duas entidades distintas como todos sabemos. Lá ficaram na lei os incentivos e até aqui têm sido bem administrados.
Nesta semana fomos surpreendidos por uma notícia fatal: as administrações regionais de saúde haviam comunicado que estava suspensa uma das componentes salariais devidas a enfermeiros e a secretários clínicos. Informação real. No dia seguinte o Ministério comunicava que o Governo estava a “estudar a forma de repor os pagamentos a todos os profissionais, sem ferir a legalidade”. Seja o que for que queira dizer esta expressão, entendo-a como o resultado de bom senso e espero que ela se transforme, nesta época festiva, em notícia de que “o governo, em cumprimento das obrigações assumidas com a Troika, resolveu fixar em 500 a meta de USF em pleno funcionamento até final do ano de 2014”. Seria confirmar uma consensual reforma de estado. - Deputado do PS ao Parlamento Europeu].
NB:
Vamos tecer algumas considerações, relativamente lógicas, em termos de justiça, sem pôr em causa o cumprimento dos contratos celebrados, entre USF-Governo.

Não sabemos em que lógica de justiça social se baseia o conceito do incentivo ao incumprimento para receber prémio para fazer exactamente o mesmo que, ao lado, outros fazem sem o prémio incentivador.
Mais parece uma imitação do miudo que faz birra para comer a sopa e a mãe lhe promete tudo, para ele ir comendo e rabujando, porque sabe que a sua força está na rabugice. O Zé Povo diz isto de outra forma: «ovelha que não berra não mama». Lembramos este mesmo ditado aos nossos colegas, mas nem sempre nos entendem...

Voltemos aos RRE (Regime Remuneratório Experimental). Este regime funcionou por capitação: tantos utentes, na lista dos ditos, tantos escudos por cabeça, onde estava incluído o pagamento aos Enfermeiros do RRE médico. A lista de utentes até podia estar guardada numa caixa de sapatos vazia, como dizia Paulo Mendo, pois esta coisa da informática, ainda vinha longe e, nem mesmo os mais visionários, a divisavam, então.
Portanto o Médico comprometia-se a tratar condignamente os utentes da sua lista, a quem fornecia nomeadamente "cuidados  Enfermeiros", pagando aos Enfermeiros de acordo com a percentagem auferida para esse efeito.
Convém lembrar aos que ainda não eram nascidos, que, no RRE, tal pagamento aos Enfermeiros, nunca foi feito, sendo os serviços de Enfermagem fornecidos de graça (pagos pela ARS, claro está, aos Enfermeiros seus funcionários).
Dizem os teóricos de certas áreas sociais que o "pecado original" é que nos condiciona. Assim, a ética católica, ao determinar, em nome de Deus Pai Todo Poderoso, quando expulsava o casal Adão/Eva, do paraiso: «Comerás o pão com o suor do teu rosto, determinou o Soberano», é uma ética punitiva.
O trabalho passa a ser um castigo para redimir o pecado original que comete quem gosta de maçãs.
A ética protestante diz, pelo contrário, que o "trabalho digtnifica o homem". Logo, quanto mais trabalha, maior é o sucesso e a dignidade.
O conflito entre estes dois conceitos é que determina o ritmo e a quantidade de trabalho.
Se extrairmos da ética católica a ideia de que o trabalho é a redenção do pecado original e a do pão suado, talvez se dispensem os incentivos para fazer bem o que faz de má vontade.
O RRE está subjacente  à concepção do DL Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de Agosto, como se pode constatar pelo espírito que o legislador lhe implantou. Ora, desde Montesquieu, autor de "l'Esprit des lois, em 1748",  admite-se que, nas leis, o seu espírito é a matriz de condução, na sua interpretação. 
  Olhemos, por momentos, o espírito do DL Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de Agosto;
 
[Nos termos da base xiii da Lei de Bases da Saúde, os cuidados de saúde primários (CSP) são o núcleo do sistema de saúde e devem situar-se junto das comunidades.
Tendo presente o exposto, o Programa do XVII Governo Constitucional assume a reforma dos CSP como factor chave de modernização e, dando cumprimento ao preceito legal acima enunciado, prevê a criação de instrumentos legais e operacionais que permitam recentrar o sistema português de saúde nos CSP e no desenvolvimento de uma matriz organizativa que conduza à reconfiguração dos centros de saúde orientada para a obtenção de ganhos em saúde e melhoria da acessibilidade.
Foi neste contexto que o Decreto-Lei n.º 88/2005, de 3 de Junho, repristinou o Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, que estabelece o regime de criação, organização e funcionamento dos centros de saúde, reestruturando-os em unidades funcionais, com especial ênfase para as unidades de saúde familiar (USF).
No mesmo sentido, o Despacho Normativo n.º 9/2006, de 16 de Fevereiro, com a redacção introduzida pelo Despacho Normativo n.º 10/2007, de 26 de Janeiro, regulamentou o lançamento e a implementação das USF enquanto estruturas constituídas por uma equipa multiprofissional, prestadoras de cuidados de saúde personalizados a uma população determinada, garantindo a acessibilidade, a continuidade e a globalidade dos cuidados prestados.
A autonomia organizativa e funcional para as USF, adoptada pelo supracitado despacho, inspirou-se nas experiências inovadoras anteriormente desenvolvidas nos centros de saúde, e que deram corpo a novas formas de organização dos cuidados de saúde, entre as quais se salienta o regime remuneratório experimental (RRE) estabelecido para os médicos.
Este modelo, em vigor desde 1998, permitiu, após várias avaliações, identificar ganhos em saúde e aumentar a qualidade dos cuidados prestados, com satisfação para os utilizadores e para os profissionais.
Acresce salientar que, em estudo recente sobre o impacte orçamental do lançamento e implementação das USF, conduzido por especialistas em economia da saúde, concluiu-se que o modelo organizativo agora proposto, construído à semelhança do RRE, vai permitir consideráveis reduções de custos na prestação de cuidados de saúde, contabilizando já incentivos para os elementos das equipas multiprofissionais.
Com efeito, equipas multiprofissionais motivadas, portadoras de uma cultura de responsabilização partilhada e com práticas cimentadas na reflexão crítica e na confiança recíproca, constituem o principal activo e a mais-valia estratégica das USF e, consequentemente, são os intérpretes mais qualificados para conduzir a reforma dos CSP.
Perante os resultados obtidos, e dado o objectivo estratégico fundamental da melhoria contínua da qualidade dos cuidados de saúde, torna-se imperativo transpor, consolidar e alargar o modelo de incentivos dos médicos a todos os profissionais das USF, potenciando, deste modo, as aptidões e competências de cada profissional e premiando o desempenho individual e colectivo, tendo em vista o reforço da eficácia, da eficiência e da acessibilidade dos cidadãos aos CSP.
Este modelo, semelhante ao implementado pelo Decreto-Lei n.º 117/98, de 5 de Maio, aplica aos profissionais da equipa nuclear um regime de suplementos associados à dimensão mínima da lista de utentes ponderada, quanto às suas características, com a contratualização anual de actividades específicas de vigilância a utentes considerados mais vulneráveis e de risco, e, quando necessário, com o alargamento do período de cobertura assistencial e com a carteira adicional de serviços.
Paralelamente, o modelo expresso no presente decreto-lei obriga ao acompanhamento e controlo de procedimentos e avaliação de resultados, distinguindo as diferenças de desempenho por referência a painéis de indicadores, a economias nos custos, a níveis de satisfação dos utilizadores e dos profissionais, bem como à implementação de programas de qualidade e de processos de acreditação.
Importa salientar que o presente diploma acolhe os princípios orientadores em matéria de vinculação, carreiras e remunerações da Administração Pública, sem prejuízo da sua oportuna revisão aquando da publicação do competente diploma.
Foram observados os procedimentos decorrentes da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio].
Podemos inferir que este espírito ao passar para o reino dos incentivos teria um pagamento "Per Capite", enquanto forma de pagamento, das USF modelo B, prescindindo os seus constituinte da remuneração de base, pois a questão dos descontos para a segurança social é letra de música. Nada que a letra da lei não possa condicionar.
Aqui está para muita gente a confusão original de pagamento por cabeça da lista, sendo o mesmo método aplicado a todos os embros da equipa. E não foi, nem é.
É por aqui que passa a disória dos que nas outras USF optaram por manter o seu vencimento base de carreira, rejeitando voluntariamente o sistema de pagamento por desempenho duma actividade irregular e permanentemente alterada pela contratação de novas bolsas de tarefas a cumprir que , assim, fazem crescer ou manter a remuneração condicionada à bolsa de serviços, ou qualquer outra designação com o mesmo fim: tarefeas a cumprir.
Ora, se para a totalidade das tarefas contratadas, lá estão os incentivos, qual a actividade laboral, que justifica a remuneração de categoria de carreira, se, nomeadamente, toda essa lógica de carreira, é suspensa com o contrato celebrado entre os proponentes da USF tipo B e o Estado!
Os ganhos obtidos segundo CC, esse tomba-louceiros e quebra cadeiras, pondo em evidência a fragilidade do material destruído e a da sua saúde mental, são:
[Certamente as despesas directas com pessoal aumentaram, mas foram compensadas pela redução de horas extra, encerramento de serviços de atendimento permanente e urgências nocturnas, pela redução dos encargos em medicamentos e meios de diagnósticos e sobretudo pela poupança de tempo do doente, simplificação do processo, qualidade do atendimento e pela visível satisfação para doentes e profissionais que consideram as USF como coisa sua.]
E não para atender doentes, que, entretanto desapareceram com a implantação dos incentivos.
Até parece que os inventores das doenças têm existência real como prova exaustivamente Jörge Black, nos "inventores de doenças".
Um malintencionado, com a mente mais perversa que a minha, pode inferir que o maior consumo de medicamentos e meios complementares de diagnósticos e horas extraordinárias em SAP, quando  os Médicos foram sendo expulsos das urgências dos Hospitais, está directamente relacionado com a forma mais directa e prática de ganhar dinheiro e não relacionado com as necessidades reais dos doentes.
Todas essas formas de atendimento e consumo, não estando relacionadas com as necessidades dos doentes, pois diminuiram ou dersapareceram com a forma de pagamento incentivador, aos incentivados Médicos, segundo diz Correia de Campos, em mais uma das suas tombalouceiradas, então os gastos com aquelas coisas eram mesmo fraudulentos, pois não se destinavam a pagar produtos necessários aos doentes, mas sim a comissionar uma actividade, permanentemente embirrada pelo agente usufrutuário da comissão, usando a estratégia infantil do menino que não quer comer a sopa e que a mãe suborna, com piedosas intenções de o engordar.
Com os incentivos os doentes deixaram de se sentir mal de noite e os SAP puderam encerrar;
As doenças deixaram de precisar de tantos medicamentos e  os poucos, podem ser dos mais baratos, possibilitando a implantação dos genéricos, porque as comissões, sempre supostas, deixaram de ser necessárias, até para estudar novas técnicas os Médicos passaram a estudar em casa e em sossego, longe do rebulicio imagiário das salas dos congressos, longínquas e vazias, nas horas de sol calcificador de ossos fragilizados por falta da absorção da vitamina, que fixa o cálcio.
Nunca tinha olhado tanto de perto as suas ideias, sobre a economia para a saúde, especialidade que obteve com bolsa a si próprio por si próprio atribuída; que o diga o Almirante, testemunha idónea.
Mas ainda fico mais baralhado, quando não sei por que fundamentou as vantagens dos incentivos desta maneira. Com apoiantes destes, não é preciso defenderem-se de outros, que não vão tanto ao centro das coisas, como este foi.
Mas que pensa das outras USF sem incentivos:
São as que fazem o que faziam os destas do tipo B, antes dos incentivos, para merecerem serem incentivados, também e passarem a B ?
Estará este deputado europeu a sofrer de um processo de evolução silenciosa e acelrada de "alzaimer"?
Com amigos destes lá se vão os inimigos para o desemprego, aumentando a lista.
 
 
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